Primeira Igreja Presbiteriana Independente de Santos
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Santos, 03 de janeiro de 2016.

Já estava escrito

 Esta época do ano é propícia para que apareçam pessoas fazendo as previsões para o ano que se inicia. Uns fazem análises a partir daquilo que observam como tendência na economia, política, etc., embora eu pense que muitas dessas análises atendem muito mais a outros interesses do que à análise imparcial dos fatos. Outros, pior ainda, usam de cartas, números, conchas, estrelas e outros elementos da criação para tentarem descobrir o que vai acontecer. E a ansiedade de uns, a curiosidade de outros e a esperteza daqueles que tentam fazer tumulto e chamar a atenção não pela verdade, mas pelo sensacionalismo.

 E que não se descarte desta lista aqueles que se dizem cristãos e, apesar de falarem em Jesus Cristo, não são, mas usam seu nome para fazerem previsões que enganosamente chamam de profecias ou revelações. E ainda acusam aqueles que não acreditam em suas mentiras de falta de fé.

 Todos  eles usam do mesmo  expediente: falam coisas tão óbvias  ou tão abrangentes que há grande probabilidade que venham a acontecer. Dizem que algum lugar do Brasil sofrerá com  enchentes enquanto outro terá secas, que haverá famosos que vão morrer e outros que terão filhos, que teremos os Jogos Olímpicos este ano e que o governo enfrentará problemas.

 Outro recurso é dizer aquilo que as pessoas querem ouvir. Sempre que alguém tem contato com uma pessoa morta (mentira), esta sempre diz (mentira) que está feliz, em grande paz, exatamente como os parentes que aqui ficaram desejam. Ou os pseudoprofetas evangélicos que sempre dizem aos pais que o filho que a esposa está esperando será grande diante do Senhor.

 Todas essas pretensas previsões se baseiam em uma grande inverdade: a de que o futuro, de alguma forma, já está determinado previamente. Nada já está decidido, segundo a palavra de Deus. Nada está escrito nas páginas de um livro,nas estrelas ou nas sendas do destino. Não existe história do futuro. O que tenta adivinhar o futuro não é ciência, mas apropriadamente chamado de ficção.

 O ser humano é incompreensível! Ele se recusa a crer em Deus e colocar sua confiança e esperança no Criador de todas as coisas. Mas infantilmente pensaque cartas, conchas e outros objetos que não pensam nem agem são capazes de determinar ou revelar o que vai acontecer em sua vida.

 Nós não nos utilizamos de nenhum desses artifícios para tentar adivinhar o que vai acontecer, até porque o futuro não está determinado. Nós temos a palavra de Deus que nos promete que Jesus está conosco todos os dias, não apenas deste ano, mas até a consumação dos séculos. E esta é a melhor perspectiva que se pode ter para toda a vida.


Santos, 10 de  janeiro de 2016.

 A igreja do futuro

 No final dos anos 70 e início dos 80 do século passado apareceu no mercado um aparelho que era acoplado à televisão e nele inseríamos uma caixinha de plástico, do tamanho de um pequeno livro e assim eramos capazes de assistir a um filme escolhido que estava naquela fita. Para os mais jovens que não viram isso,chamava-se videocassete. Dizia-se na época que esse aparelho acabaria com os cinemas, pois agora a pessoa poderia escolher o que assistir no conforto de sua casa à hora que quisesse. De fato, muitas salas de cinema foram fechadas. Aqui em Santos tínhamos os cines Indaiá (o que eu mais gostava), Iporanga, Praia Palace, Independência, Alhambra, Glória, Brasília dentre muitos que fecharam.Mas abriram outros cinemas, menores é verdade, nos shoppings e o Roxi que foi dividido em várias salas. Mas o fato é que os cinemas continuam bem vivos, um pouco diferentes dos daquela época, mas cheios de gente e de pipoca (uma parte essencial). E os vídeo-cassetes? Quem se lembra dessa peça de museu? Foram substituídos pelos DVDs e estes já estão quase esquecidos, empoeirados, já substituídos por melhores alternativas para assistirmos filmes.

 O fato é que, assim como com a tecnologia volta e meia aparecem novidades as quais as pessoas acham que vão mudar o mundo, assim também acontece com os movimentos sociais e com a igreja.

É verdade que existem coisas que mudam mesmo e definitivamente o comportamento das pessoas. Veja-se o caso da internet. Mas, por incrível que pareça, no início não eram muitas pessoas que achavam que uma rede de computadores pudesse ter muita utilidade prática. Pensavam que era coisa para bibliotecas,universidades e atividades acadêmicas.

 A história da igreja, principalmente a das últimas décadas, tem mostrado que o mesmo ocorre com os movimentos eclesiásticos. Volta e meia aparece alguma novidade que se apresenta como a igreja do futuro, faz um furor tremendo e depois cai no esquecimento, para não dizer no ridículo. Que se lembra dos anos 90, certamente se recorda dos movimentos místicos (que se apresentavam como espiritualidade) que promoviam coisas muito úteis para a vida e a fé como os dentes de ouro. Mas não foi só nessa época e nem somente essa manifestação.Muitos modismos e novidades apareceram e sumiram na vida da igreja. Tantos, que nem nos lembramos deles por tão fugazes que foram.

 Cada um desses movimentos traz consigo algo, talvez a lembrança de uma esfera que andava meio esquecida e desprezada pelo povo de Deus. E cada um deles deixa uma marca na vida eclesiástica. A igreja nunca é a mesma depois que eles passam,graças a Deus. Quem que viveu os anos 50 e 60 na igreja poderia imaginar que um dia haveria uma guitarra elétrica ou uma bateria tocando no templo? Ou homens adultos participando do culto sem estarem devidamente trajados com terno e gravata? Ou pessoas do outro lado do mundo participando do culto de sua igreja através de um computador?

 Tudo isso me faz pensar que, quando aparece alguma novidade prometendo ser a igreja do futuro, é preciso ter muito cuidado. Não se pode desprezar o que de novo chega, simplesmente porque é novo, nem aceitar tudo que aparece sob o mesmo argumento. Sabemos que há coisas que não podem mudar na vida do povo de Deus,como o amor e o compromisso com o Senhor, a comunhão e o arrependimento, e outras coisas que nos fazem ser cristãos.

 Mas há características da vida do povo de Deus, sua forma de ser que podem mudar. Oque precisamos é buscar a sabedoria do Senhor para discernir quais as mudanças que são positivas e quais não são.


 Santos, 17 de janeiro de 2016.

 Ele cuidará de ti

 Existem algumas certezas na vida, dentre as quais a certeza de que qualquer pessoa, em um ou outro momento experimentará a insegurança e a dor de sofrer por algum motivo. Ao se deparar com enfermidades ou morte, problemas financeiros ou familiares, etc., as pessoas se sentem ameaçadas, inseguras e amedrontadas. Há pessoas que sofrem por algum motivo pelo qual são, em maior ou menor grau,culpadas. Fizeram coisas ou se omitiram em ocasiões cuja consequência natural é padecer por aquilo. Outras pessoas não têm nenhuma culpa pelo que passam.Outros erram ou ninguém fez nada que pudesse causar ou cessar a dor. Mas o fato é que todos, pelo menos alguma vez, haverão de padecer algum tipo de necessidade material ou espiritual.

 E os dias de crise que vivemos parecem ser o contexto propício para que mais e mais pessoas se sintam perdidas quanto ao presente e inseguras quanto ao futuro. A incerteza da economia, a violência das ruas, a falta de ética e moralidade, as transformações profundas e rápidas dão-nos a impressão de que o mundo que vivemos está mudando velozmente e para pior. Onde tudo isso vai parar? E as pessoas ficam como que se tirassem o chão de debaixo delas, sem saber onde pisar, o que pensar, como se comportar e para onde ir.

 Os cristãos não precisam se sentir assim. Eles têm um paradigma, um modelo  para quem olhar e se espelhar.  E em quem confiar totalmente.  Eles têm a Jesus Cristo, seu Senhor e Salvador. Nele e só nele se pode confiar.

Se pode confiar porque ele conhece os seus problemas e tem exata compreensão da real dimensão das suas necessidades. A pessoa imersa em aflições tem a tendência de ou subestimar ou superestimar a sua dor, mas o Senhor conhece melhor do que ninguém quão profunda é a crise em que tal pessoa se encontra. Ele sabe quais as ameaças e quais as possíveis consequências daquela situação. E conhece igualmente qual é a melhor, mais justa e adequada solução para os problemas pelos quais cada um está passando.

 Se pode confiar porque ele tem cuidado deles. Desde o tempo da criação que Deus está junto do ser humano, dialogando com ele, ouvindo suas lamentações, petições e orações. Mesmo quando as pessoas tentaram fugir dele, ele os buscou de volta para junto de si. O Senhor nunca abandonou a sua criação, especialmente o ser humano, mesmo quando este se houve rebelde. O Pai sempre cuidou das pessoas,especialmente das que são seus filhos. Deus cuidou e cuida de cada um,principalmente dos que pertencem ao seu povo.

 Se pode confiar porque as suas misericórdias se renovam a cada manhã. O Senhor dá acada dia aos seus filhos a porção necessária para a sua vida. Nem sempre ele dá a fartura que venha a ser mais do que o necessário, mas ele também não permite que o básico venha a lhes faltar. Se algum filho de Deus passa necessidade é porque a igreja está falhando no repartir o pão de cada dia, não o Senhor. 

 Se pode confiar mesmo quando não se entende a vontade de Deus. Somos obrigados a reconhecer que nem tudo o que acontece é da vontade divina e que nem sempre somos capazes de entender os propósitos do Senhor. Mesmo assim podemos confiar que não há força que possa suplantar o poder do Senhor e que tudo ele pode usar para fazer cumprir os seus santos propósitos.

 Em meio a todas as incertezas da vida, a maior de todas as certezas é de que no Senhor podemos ter total confiança.


 Santos, 24 de janeiro de 2016.

 Deus e o sofrimento

Numa pequena aldeia do Paquistão um jovem de 15 anos se confundiu com a pergunta do mestre nos ensinos da fé islâmica e levantou sua mão quando este inquiriu que mali não acreditava nos ensinos de Maomé. Para não cair em desgraça na sua comunidade e provar sua fidelidade à sua fé, cortou fora sua própria mão. Tal ato o fez ser respeitado.

Certamente todos nós achamos esta atitude insana e nos perguntamos que concepção é essa a respeito de Deus que imagina que ele vá se alegrar com um jovem que decepa sua própria mão apenas porque ouviu mal uma pergunta e errou na resposta. Que divindade será esta que peça que um rapaz se mutile para provar sua fidelidade?

Nós,cristãos ocidentais, olhamos para esse e outros lamentáveis fatos com olhar de reprovação, indignação e admiração por não entendermos como possa haver uma religião e uma cultura que desenvolva ideias e praticas como essas.

Mas não deveríamos ter tal atitude. Deveríamos,antes, olhar para nós mesmos com olhar crítico. Não imaginamos nós, também, um Deus violento?

Nos últimos anos tem se acirrado uma postura agressiva dos cristãos, especialmente os evangélicos neo-pentecostais, para com outros grupos religiosos. Tal postura vem se inserido entre nós sutilmente há anos através de pregações e cânticos que defendem uma suposta “batalha espiritual” que seria uma espécie de declaração de guerra a quem não crê como eles, especialmente as religiões islâmica e as afro-brasileiras. Elas são demonizadas e, por isso, se justifica todo e qualquer ato de violência contra elas, moral ou física.

Além da violência contra o diferente, muitas vezes nos impingimos aflições sobre nós mesmos também em nome de Deus. Já ouvi muitos irmãos e até pregadores dizerem que algum tipo de problema, geralmente grave, que alguém está passando é castigo de Deus por conta de um pecado cometido no passado e ainda não confessado.

E nós também já vimos e ouvimos de pessoas que se submetem até a sacrifícios e privações ou em gratidão ou em oferta para alcançarem algum favor do Pai. Entre católicos é muito comum as promessas e entre os protestantes e evangélicos muitos se submetem a jejuns ou ofertas em dinheiro na esperança de que o Senhor atenda seus pedidos em resposta aos seus atos. Seja com atos ou com riquezas,sempre são tentativas de comprar o favor divino.

Falta às pessoas conhecerem a graça de Deus. Aquele que gratuitamente entregou seu único Filho em favor de nós, para que morresse pelos nossos pecados e ressuscitasse para termos vida plena não precisa e não quer que lhe demos nada em troca desta ou daquela bênção. Nem é uma divindade vingativa que deseja o sofrimento de alguém por algum erro que cometeu.

 Falta às pessoas conhecerem o amor de Deus. Ele não impõe a sua vontade pela força e violência, mas estimula a comunhão e manda o amar todas as pessoas. Ele não se alegra com a dor e o sofrimento das pessoas, especialmente dos seus filhos.

Falta às pessoas viverem o que é verdadeiramente a vontade de Deus: a fé, a esperança e o amor, porém o maior desses é o amor.


 Santos, 31 de janeiro de 2016. 

Há vida fora da Terra?

Por maisque a ciência e a tecnologia tenham avançado, até este ponto do desenvolvimento humano permanecem alguns mistérios acerca do universo e do próprio ser humano.Por exemplo, é possível admitir que os seres vivos tenham evoluído a partir deformas de vida muito simples até as mais complexas. Porém, é difícil entender como de elementos inanimados surgiu, sem nenhum tipo de interferência externa,um primeiro ser vivo. Ninguém consegue explicar, do mesmo modo, como a evolução das espécies se deu tão coerentemente e em tão pouco tempo sem uma inteligência a orientá-la.

Outra pergunta sem resposta e para a qual a humanidade despende um montante considerável de esforço e dinheiro é se há vida fora de nosso planeta. Muito já se falou a respeito tanto afirmando que existe quanto afirmando que não existe.No Brasil, popularizou-se uma lenda a respeito de um extraterrestre encontradona cidade mineira de Varginha. Por aqui o tal ET virou mais motivo de folclore e piada do que qualquer outra coisa

Porém,nos Estados Unidos, onde existe uma lenda semelhante, ela é motivo de acalorados debates e denúncias de que o governo estaria com o corpo de um ET morto a décadas.

O que é certo é que tudo que é mistério atiça a curiosidade do ser humano e faz levantar um sem-número de ideias, algumas totalmente sem sentido. Alguns dias atrás, cientistas publicaram um artigo muito interessante afirmando que não encontramos vida em outro planeta porque ela já foi extinta e ficamos só nós nesse imenso universo. Que interessante! Nem chegamos ao planeta mais próximo de nós no Sistema Solar e já somos capazes de dizer o que acontece no fim da galáxia mais distante.

 Há os que afirmam que não pode existir vida em outro lugar porque Deus criou todo o universo somente para o ser humano. Ora, em nenhum lugar a Bíblia afirma issoe, convenhamos, Deus é soberano para fazer o que lhe apraz. Se ele assim estabelecer, quem somos nós para questionar?

Do mesmo modo, não existe nenhuma evidência concreta de que há seres vivos fora de nosso planeta. É verdade que de vez em quando nos deparamos com alguns muito parecidos com o Chewbacca, mas é mera coincidência.

O fato é que, por enquanto, tudo é mera especulação e sem nenhuma consequência prática para a vida ordinária das pessoas. Não faz o dólar cair nem a ação da Petrobrás subir, não diminui o desemprego nem aumenta o salário de ninguém. Todavia, no interesse da ciência, as pesquisas devem continuar.

E quanto a nós, devemos continuar entendendo que Yahweh, o Senhor, é o criador e preservador de tudo o que existe, que todo o universo foi por ele criado e que outros seres, em outros planetas, se houver, são também suas criaturas e, como nós, seus servos e dele dependentes.


 Santos, 07 de fevereiro de 2016.

 O que eu faço não o sabes agora

No início da última noite que Jesus passou com seus apóstolos, ele lavou os pés dos seus discípulos. Esta era uma tarefa para a qual eram designados escravos ou pessoas de condição muito humilde. Era mesmo uma tarefa necessária, mas considerada indigna, humilhante. Ao iniciar o procedimento, Pedro se levantou e se rebelou, dizendo que o Senhor não poderia fazer aquilo. E Jesus lhe respondeu com as palavras que dão título a esse escrito.

A atitude de Pedro parece insubordinação, desobediência e revolta, pois quem era ele para questionar o que Jesus Cristo fazia? Parece até que Pedro pensava que poderia estar mais correto que o Mestre, que seria mais justo que o Senhor. Que insensatez a de Pedro!

Mas antes de acusa-lo, é preciso tomar em conta dois aspectos. O primeiro diz respeito a Pedro. Ele estava reagindo dentre daquilo que era a sua  cultura, daquilo que  seria esperado dele. Afinal, no seu mundo,apenas um servo, um escravo ou uma pessoa de posição muito baixa lavaria os pés dos convidados para um banquete. Ao reagir do jeito que ele reagiu, Pedro estava apenas dizendo que não era ele maior que Jesus. Ele não estava se rebelando, ele não estava entendendo o que estava acontecendo.

Outro aspecto a ser considerado antes de criticar Pedro refere-se a nós mesmos. Nós também nos comportamos muitas vezes como o apóstolo. Não entendemos o que o Senhor está fazendo e queremos interferir, mudar os acontecimentos para que eles se enquadrem dentro das nossas expectativas, daquilo que entendemos como certo ou errado. Tentamos corrigir a Deus. 

As pessoas não se comportam assim, necessariamente, porque querem ser desobedientes. Penso que essa não fosse a intenção de Pedro. Ao contrário, em seu pensamento, ele estava sendo submisso a Jesus. Mas, de fato, não estava. Em vez de pretender que o Mestre se enquadrasse em sua cultura, ele deveria aceitar o que Jesus estava fazendo. Mesmo que não fosse capaz de entender naquele momento o que isso significava. 

Nem sempre somos capazes de compreender o que Deus está fazendo. Em nossas mentes limitadas temos uma visão de que ele age desta ou daquela forma e não percebemos que a sua ação vai muito além daquilo que somos aptos a perceber ou compreender. Não fazemos isso por mal, mas por limitação, incapacidade de percebera totalidade e o alcance do agir de Deus e o fim de seus propósitos. 

Devemos orar pedindo a Deus a capacidade de discernir as suas obras e submissão em aceita-las mesmo quando não as compreendemos. Certamente que podemos e devemos expor ao Senhor nossos desejos e expectativas, mas como tal, eles estão sujeitos aos planos do Pai. Mesmo quando não somos capazes de compreender a razão pela qual ele esteja agindo desse modo.


Santos, 14 de fevereiro de 2016.

 Para quê você vem à igreja?

Para nós, crentes, principalmente aqueles que desde cedo foram criados no ambiente protestante, é um hábito ir à igreja. Tão forte é este costume que mesmo quando estamos de férias em outro lugar, viajando a passeio, nos sentimos compelidos a visitar uma comunidade evangélica onde estivermos. E, se num domingo, por algum motivo não podemos ir aos trabalhos que frequentamos, parece que está faltando alguma coisa. 

Na igreja encontramos amigos tão próximos que os chamamos de irmãos. E, na verdade os são, quase fisicamente. Lembro que em minha infância nossa comunidade era composta por famílias que cultivavam o amor fraternal a gerações Alves,Gonçalves, Vidal, de Paula e outras. Embora essa realidade tenha mudado bastante nos últimos anos, ainda hoje temos amigos muito queridos, verdadeiros irmãos. E como os irmãos de sangue, os espirituais se desentendem às vezes, mas tal um como outro também logo se reconciliam porque o amor que os une é maior que as diferenças. A comunidade cristã é um excelente ambiente para se frequentar.

Este convívio é maior do que um clube social, mais profundo do que um simples encontro, é a comunhão espiritual que existe entre os crentes. Nesta comunhão acontecem eventos sociais, como os almoços e jantares, comemorações diversas,etc. Estes eventos são gostosos, mas a igreja não existe para eles. Eles são consequências da comunhão, mas não a comunhão em si.  Esta é mais forte e verdadeira, a base para os festejos que fazemos. 

A alegria manifesta em nossas reuniões, especialmente nos cultos, o bom ambiente e a paz que permeia as relações entre os membros e frequentadores também parece ser uma boa razão para aqui estar. É bom estar em um bom ambiente, é revigorante poder sentir um pouco de paz, harmonia e esperança em meio aos tantos conflitos que se vive no dia-a-dia. 

Todos esses e muitos outros são bons motivos para se frequentar esta comunidade, mas não são eles o motivo fundamental pelo qual devemos vir à igreja. A igreja é a reunião daqueles que adoram a Deus. A razão da sua existência é o servir ao Senhor. Tal serviço se dá individualmente em que cada cristão empenha todas assuas forças e capacidades para a promoção do reino de Deus, e coletivamente eque todos aqueles que o adoram de fato e de verdade se reúnem para a celebração ao nome do Senhor. O motivo para irmos à igreja é o culto a Deus como expressão da vida de adoração ao Senhor. 

E tão importante quanto o porquê vir é a razão de sair. Sim, pois que não saímos da igreja apenas para voltar para a segurança e aconchego dos nossos lares, para ganharmos o pão de cada dia, para termos a nossa vida social, etc. Saímos para servir a Deus e ao próximo em cada uma dessas e de todas as outras atividades que desenvolvemos dia após dia. 

Vimos à igreja para adorar ao Senhor, mas esta adoração só será verdadeira se nossa vida toda for um culto a ele. 


Santos, 21 de fevereiro de 2016.

 Vidas marcadas

 Henry Sobel é um rabino norte-americano radicado no Brasil desde a década de 1970.Seu trabalho e contribuição em várias áreas da sociedade brasileira e internacional são inestimáveis. Foi uma das principais lideranças religiosas na luta pelo fim da ditadura e democratização pacífica da nação, assim como tem sido um crítico da atuação de Israel junto aos palestinos. Participou intensamente o diálogo entre judeus e cristãos e liderou a comunidade hebraica brasileira na sua inserção na sociedade e interação nos problemas nacionais.Ele foi e é uma reserva moral e uma referência para todos os brasileiros e judeus do mundo todo. 

No entanto, em 2007 ele foi notícia não por um pronunciamento ou atuação destacada em benefício de alguém ou de alguma causa. Ele foi preso nos Estados Unidos por roubar umas gravatas de lojas de luxo. Embora este triste episódio não tenha tido maiores consequências jurídicas, pois foi logo resolvido legalmente,moralmente afetou e afeta o rabino até hoje. Desde então, para muitas pessoas,Henry Sobel deixou de ser o líder de tantas causas de alto valor moral, para ser o rabino que roubou umas gravatas. Em meio a tantas contribuições importantes,passou a ter a toda a sua vida marcada por um único episódio infeliz.

Este é um caso notório e extremo por envolver uma pessoa pública, com exemplar história de vida e que se envolveu em uma questão tão pequena, mas não é o único. Infelizmente, pessoas dignas, que prestaram grande contribuição para outras pessoas, para seu país e até para a humanidade ficaram marcadas por um erro que cometeram e não pelo grande bem que promoveram. Isso é uma grande injustiça, afinal, quem nunca teve um momento infeliz e cometeu algo do que se arrepende? 

Não estamos pregando a irresponsabilidade ou a impunidade de boas pessoas que fizeram algo de errado, mas como no caso rabino, já acertaram suas contas com ajustiça. Elas, no entanto, permanecem estigmatizadas pelo seu erro e esquecidas pelos seus bons grandes feitos. Isso decorre do fato de que o mundo, apesar de ele mesmo estar imerso em iniquidade e pecado, é incapaz de perdoar. Ou talvez tenha mais facilidade em perdoar as pessoas que se deixam moldar por ele do que aqueles que procuram vencer o pecado e a violência pelo amor, pela justiça e pela paz. 

Os cristãos, por um lado, não podem ser assim. Todos os cristãos sabem que são pecadores e estão sujeitos a cair em pecado. E, de fato, caem. Todos os cristãos o são porque são perdoados por Deus de seus pecados. Por isso, não podem condenar outros por também o serem. Jesus, por diversas vezes, exigiu que seus discípulos perdoassem uns aos outros e ainda colocou o seu perdão de forma condicional. Por isso não podemos marcar as pessoas. 

Por outro lado, precisamos ser cautelosos, tendo a consciência de que um erro que cometamos nos marcará muito mais do que muito bem que possamos praticar. As pessoas, impiedosamente, se lembrarão de nós mais por aquele momento de infelicidade do que por muitos bons momentos que possamos proporcionar. Coisas que hoje nos parecem inocentes poderão nos acompanhar por toda a vida. Por isso precisamos ser extremamente cautelosos. 

Aquele que anda sempre nos caminhos do Senhor nunca ficará marcado por mal algum que tenha praticado.


 Santos, 28 de fevereiro de 2016.

 O servo de Deus

Na confusão religiosa em que vivemos, muitas pessoas se enganam acerca do papel que o ser humano desempenha perante Deus. Há pessoas, inclusive, que usam de expressões chulas e desrespeitosas para com o Senhor como, por exemplo, “o cara lá de cima”. Ora, o Pai não é “o cara” e muito menos está só “lá em cima”. Há quem tenha a Jesus como um ídolo, como um pop star, como um pensador ou algo do gênero. Esquecem-se de que ele é o Senhor. E se ele é o Senhor, nós somos seus servos. 

É verdade que nem todos são servos de Deus. Muitos, talvez mesmo a maioria, se rebela contra ele. Ou simplesmente o ignora. Para essas pessoas, Deus é uma ideia circunscrita ás paredes dos templos religiosos ou que simplesmente não existe. 

Para aqueles que reconhecem o verdadeiro lugar de Yahweh em suas vidas, a posição que ocupam diante dele é uma só: a de servo de Deus. Há quem pense que ser servo de Deus é uma posição degradante, que ele humilhe com isso o ser humano.

Ainda que assim fosse, Deus não estaria abusando do seu direito de criador e soberano. Mas tal visão é distorcida. No Oriente Antigo, ser servo de um rei era ocupar uma posição de alta dignidade. Na hierarquia política e social era estar imediatamente abaixo do próprio monarca. Assim deve ser visto quem serve a Yahweh: não tem poder em si mesmo, mas desfruta da dignidade de servir a quem é Todo-poderoso. 

Mas servir a Deus implica em certas atitudes. A primeira delas é a submissão. O servo sabe que todo o poder está nas mãos de seu senhor e não nas suas. A ele não cabe decidir ou impor sua vontade, mas cumprir o que seu soberano determina. Ele, por sua posição de proximidade, pode expressar seus desejos,sabendo, entretanto, que palavra final é do senhor e não dele. 

Saber só não basta. É preciso cumprir a decisão do seu mestre. Por isso, o bom servo é também obediente. Aliás, para que serve um servo que não obedece? Ao servo não cabe decidir, questionar. Ao servo cabe obedecer. Certamente que o Senhor não nos impõe a sua vontade de modo inquestionável, irracional. Ele nos ensina a respeito do seu querer e nos mostra o motivo porque assim estabelece. Mas a sua palavra deve ser obedecida. 

O servo de Deus ocupa esta posição para cumprir uma missão dada a ele pelo Senhor. Amissão não é do servo, mas daquele que chama, comissiona, capacita e confere autoridade para que ela seja cumprida. Todos os servos de Deus o são porque são chamados para uma tarefa. A missão é multiforme, ela tem vários campos de atuação, aspectos, dimensões e alcances. E todos eles, em conjunto, contribuem para o propósito divino. 

Ser servo de Deus não é uma opção da pessoa, mas um chamado divino irresistível.Mas ser um servo bom e fiel, em quem Deus se alegre, é produto, em parte, do esforço humano de cumprir o papel que o Senhor lhe confere.


Santos, 06 de março de 2016.

 Bíblia e direitos humanos

Após o fim da II Guerra, o mundo estava aterrorizado com as atrocidades descobertas nos campos de concentração nazistas e temeroso do que poderia a vir a ser uma possível III Guerra e buscou estabelecer bases que assegurassem que ela não viesse a acontecer e que as mazelas descobertas não se repetissem jamais. Uma das atitudes tomadas foi a adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos pela ONU em 10 de dezembro de 1948.  Esse documento, embora não tenha força de lei, é uma referência no direito internacional. Foi elaborado na França sob influência do canadense John Peters Humphrey e da ex-primeira dama dos EUA, Eleanor Roosevelt. 

No Brasil, a expressão direitos humanos ficou desgastada em função, por um lado de alguns exageros de ativistas e, por outro lado, da atribuição a eles da incompetência do estado em promover a segurança e a justiça com equilíbrio e sem provocar mais violência. Tais erros têm levado a visões distorcidas como se os direitos humanos promovessem a impunidade, o desrespeito, etc., ou estivessem ligados a regimes de esquerda. Essa mentira é desmascarada ao se observar que esse documento é mais respeitado em países capitalistas nos quais a justiça tem papel fundamental, como EUA, Grã-Bretanha, França, Alemanha e outros.

O fato é que não se pode jogar fora uma importante iniciativa de paz por conta de erros e distorções de grupos isolados. Principalmente num país onde as pessoas são submetidas a trabalho escravo, execuções, toque de recolher imposto pelo crime e outros abusos. 

O que muita gente não sabe é que os Direitos humanos têm muita ligação com a Bíblia.A começar pelo fato de que o mais antigo documento que aponta para direitos das pessoas é o cilindro de Ciro, um texto do mesmo imperador persa que libertou os judeus da Babilônia e permitiu que eles voltassem para Jerusalém. 

As ligações não param por aí. A narrativa da criação de Gen. 1 é um testemunho de que todos os seres humanos foram criados iguais em dignidade, pois todos –homens e mulheres – foram feitos à imagem e semelhança de Deus. Ela difere de todas as outras estórias de criação do mundo antigo em que o rei sempre tinha sido criado em maior dignidade que os outros. Diferente das culturas que acercavam, a Bíblia afirma que todos os seres humanos tem o direito à mesma dignidade. 

Já o Salmo 24 afirma que do Senhor é a terra. Essa afirmação em seu contexto tem uma força muito grande. A terra era o principal e quase único meio de produção. Quase não havia indústria, muito pouco comércio e praticamente ninguém vivia de prestar serviços, além dos sacerdotes. Desse modo, quem possuía terra tinha de onde tirar seu sustento, quem não possuía estava praticamente condenado a ser escravo. A posse da terra era garantia de dignidade social e econômica. Ao afirmar que a terra é do Senhor, o salmista afirma que todos têm direito ao trabalho digno. 

Se observarmos com cuidado, veremos que tudo aquilo que é considerado como direito inerente à condição humana, já era defendido nas páginas da Bíblia, seja de uma ou de outra forma.  A vida, a educação, a preservação da família, a igualdade de direitos e deveres entre todos na sociedade, o julgamento justo dos criminosos, todos esses e outros direitos são previstos nas Escrituras Sagradas. 

Os cristãos deveriam ser os primeiros a defender esses direitos, não se deixando levar por extremismos de qualquer natureza, mas exigir o equilíbrio no verdadeiro exercício da justiça e do direito.


Santos, 13 de março de 2016.

Eu acredito em anjos

A nossa cultura cristã ocidental está repleta de representações de seres celestiais,muitas vezes desenhados como criancinhas brancas, loiras de preferência,gordinhas, rosadas e com asas. Outras vezes esses seres são apresentados como humanos adultos, brilhantes, vestidos com longas túnicas brancas e também com asas. São os anjos, citados na Bíblia. 

Grupos esotéricos usam a ideia da existência desses seres para promover o falso ensino e criam a fantasia de diferentes hostes celestiais com nomes, categorias,funções e configurações. A tais seres são dedicadas orações e oferendas como se eles fossem uma espécie de semideuses. Certamente que quando a Bíblia se refere a anjos não são deste tipo. 

Embora as Escrituras Sagradas mencionem querubins e serafins, acredito mais em outro tipo de anjos. Anjos feitos de carne e osso, que não têm asas e nem brilham,mas que são pecadores como nós. Conto uma experiência pessoal para exemplificar. 

Anos atrás, estava trazendo de carro a Lesieux de São Paulo, onde ela tinha se submetido a uma delicada cirurgia. Quando entramos na Imigrantes um carro bateu fortemente na traseira do nosso. O impacto deformou a carroceria de modo que furou um dos pneus traseiros e prendeu o estepe no porta-malas. Ficamos ali na beira da estrada sem poder sair e sem poder chamar socorro. Nisso, sem motivo nenhum, para um carro e seu condutor nos empresta o seu estepe, do mesmo aro dos pneus do nosso carro, e nos ajuda a trocá-lo. Só vi aquele homem uma vez mais, no dia seguinte, quando fui devolver o pneu. Quem emprestaria um pneu para um desconhecido, sem garantia de tê-lo de volta? Não lembro mais dele e nem do seu nome, mas sei que foi um instrumento de Deus para nos tirar daquela situação. 

Apalavra anjo vem do grego e significa mensageiro.  Anjos são enviados de Deus para nos trazerem uma mensagem em um momento específico. Ela não precisa ser,necessariamente, em palavras ou um aviso, uma advertência. A mensagem de Deus pode ser uma ação. E quem nunca recebeu uma importante e inesperada ajuda em um momento crítico? Ou uma palavra esclarecedora, confortadora ou exortativa de quem não era esperada? Se vierem de Deus, podemos dizer que eram anjos humanos,mandados pelo Senhor dentro de uma situação de necessidade. 

Tal condição nos leva a suspeitar que Deus possa querer nos usar também como seus anjos para socorrer com palavras ou atitudes alguém que precise de nós. Dia após dia nos deparamos com pessoas necessitadas de um apoio ou de uma orientação. Muitas vezes sabemos do que essas pessoas precisam e temos os recursos necessários para socorrê-las. Mas nos omitimos.

Saibamos que o Senhor nos quer como seus mensageiros para socorrer as pessoas que de nós necessitam. Ele quer que sejamos seus anjos.


Santos, 20 de março de 2016. 

O que esperar de Jesus

 As narrativas bíblicas do tempo antes da crucificação de Jesus mostram a população da Judéia dividida em grupos, cada qual com interesses e expectativas diferentes acercado Senhor. À medida que a narrativa vai se desenvolvendo vão surgindo os personagens e vamos nos dando conta de como eles se relacionavam com o Mestre e o que dele esperavam. 

O caminho de Jesus para a cruz começa em Mc 10, ele se encontra no Vale do Jordão e à sua volta se reúne a multidão para ouvir falar acerca da preservação da família e contra o acúmulo de riquezas. Lá estão também os fariseus para prova-lo e tentar achar algo contra ele e está Bartimeu, o cego, o único com nome que reconhece que Jesus é o Messias, o Filho de Davi. 

Jesus se aproxima de Jerusalém a passa pelas vilas camponesas, Betfagé e Betânia, onde moravam amigos do Senhor como Marta, Maria e Lázaro. Eram pessoas pobres,agricultores que viviam de abastecer a Capital com o fruto do seu trabalho.Nessas aldeias o Mestre encontrou seguidores dispostos a lhe emprestar sem hesitação um jumentinho, animal caro na época, para que ele fosse à Jerusalém. Certamente eles esperavam que se   Jesus assumisse  o trono de Davi eles fossem de alguma forma beneficiados,mesmo que somente tirando o peso que a Capital e o templo exerciam sobre os camponeses. 

No caminho das vilas para Jerusalém se ajuntou a multidão em torno dele novamente. Esta era outra multidão. Era formada por pessoas pobres da Judéia, da Galileia e de outras partes que vieram para a festa da Páscoa. Como eram pessoas pobres e lá não havia muitas acomodações, essas hospedarias eram ocupadas por pessoas ricas e eles que se virassem em tendas fora da cidade. Essa multidão tem bem claro na sua palavra o que esperava de Jesus: Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o reino que vem o reino de Davi, nosso pai! Hosana, nas maiores alturas! (Mc 11:9-10) Eles esperavam que Jesus estabelecesse o seu poder imperial, destituindo os romanos e os que os apoiavam. E, logicamente, eles se libertassem desse jugo. 

Particularmente os apóstolos estavam também esperançosos e interessados em ter Jesus como rei em lugar dos romanos. Em Mc 10,35-41, Tiago e João pedem ao Mestre um lugar privilegiado no seu possível governo. Os demais deveriam compartilhar sentimentos semelhantes. Afinal, quando ele se tornasse rei precisaria de pessoas de sua confiança para comandar seu governo. 

Diferente de todos esses era a elite dentro do muro, composta pelos governantes, pelos seus apoiadores e pelos ricos que visitavam Jerusalém para a Páscoa. Deles faziam parte os fariseus que foram questionar Jesus junto ao Jordão. Viam o Senhor como uma ameaça e esperavam a primeira oportunidade para prendê-lo. Eles pediram que fosse crucificado. Esperavam que a sua morte acabasse com aquele problema.  

Jesus frustrou a todos. Não confrontou as autoridades, não assumiu o trono de Jerusalém. É verdade que a elite o matou. Mas ele também não correspondeu às expectativas deles. Ele fez o que ninguém esperava: ressuscitou, vencendo a morte e demonstrando qual é o seu reino. 

Assim como todas aquelas pessoas, criamos esperanças em torno de Jesus Cristo. Isso não é errado em si. Mas precisamos ter em mente que o Mestre pode não corresponder às nossas expectativas, mas trazer uma solução que ninguém poderia esperar. 


Santos, 27 de março de 2016.

Ressurreição já

 Quando seu amigo Lázaro morreu, Jesus foi até a sua casa e encontrando com uma de suas irmãs, Marta, disse a ela que seu irmão haveria de ressuscitar. Ela respondeu que cria que ele ressuscitaria no último dia, ao que o Mestre lhe disse que quem nele crê não morreria. Depois disso, Jesus procurou o túmulo de Lázaro e,como sabemos, o chamou de volta da morte. O ressuscitou para que ele voltasse à sua vida, seu trabalho, seu cuidado com as irmãs, etc. Não é errado supor que,embora ele voltasse à vida normal, a sua vida nunca mais seria normal. A experiência de morrer e ressuscitar havia de ter transformado Lázaro.

 A ideia de ressurreição nos faz pensar em algo que se experimentará num futuro distante, após a nossa morte e quando Jesus voltar para implantar definitivamente seu reino em plenitude. De fato, esta será a concretização final de todas as promessas do Senhor para com a humanidade e para com o seu povo. Aguardamos ansiosamente por esse dia, o objetivo da história, a concretização dos propósitos divinos para o nosso universo. 

Há,inclusive, aqueles que ainda hoje pregam uma espécie de sacrifício e resignação diante das dores deste mundo a fim de que se possa ganhar o céu e suas alegrias. É a falsa teoria de que é preciso padecer para conquistar o paraíso e quanto mais se sofre, maior será a recompensa quando se chegar ao céu. Essa mentira só serve para dominar os pobres inocentes e fazer com que eles não tentem se revoltar e mudar a sua situação. 

A questão é que não precisamos esperar morrer para depois ressuscitar e aproveitar a vida e o reino de Deus. Deus criou este mundo cheio de belezas e prazeres e nos colocou nele para que dele desfrutemos. A vida é uma bênção do Senhor para que tiremos proveito dela, não para que soframos com ela. 

É fato,também, que o pecado distorce a criação, prometendo falsos prazeres e promovendo a destruição, a morte em lugar da vida. Anuncia o que parece servida, mas não é, é morte. E como a falsa propaganda que vende o péssimo produto como se fosse bom, o pecado propaga a morte como se fosse vida. 

Mas o Senhor tem para nós a ressurreição desde já. É experimentar a vida que emerge da morte, que deixa para trás o pecado e sua forma de viver, mesmo que essa seja anunciada como boa e pareça como tal. É viver o paraíso desde já. Ele não fica sendo um lugar no qual nós chegaremos um dia, mas a segurança de saber que se pertence a Jesus e nada nem ninguém, nem mesmo a morte pode nos tirar dessa condição. Por mais sofrimento, por mais violência que se sofra, por mais engano e frustração que se tenha nesta vida, nada pode alterar a condição de sermos filhos de Deus e de que experimentamos desde já a sua presença, o seu reino e a sua vida.

Ao comemorarmos a ressurreição de Jesus, lembramos que com ele nós também já ressuscitamos e vivemos na esperança pelo reino de Deus.


 Santos, 03 de abril de 2016.

Igreja e política (lha) 

Há um ponto no qual os analistas concordam: é que vivemos hoje no Brasil um dos períodos mais conturbados de sua história política. A cada dez minutos as notícias se alteram nos sites da internet, para um lado e para outro. E a própria imprensa é alvo de desconfiança e descrédito. Uma notícia, dentre tantas manchetes sensacionalistas, me chamou a atenção especialmente: a de que uma determinada igreja havia rompido com o governo. 

Em primeiro lugar, deve-se dizer, não foi noticiada qual a igreja a que a reportagem se referia, mas nem é preciso. Dado o fato de que um ministro ocupava determinada pasta por sua indicação e que perdeu esta condição depois do tal rompimento, fica claro a respeito de quem falava o noticiário. 

O que me chama a atenção é que uma instituição eclesiástica, seja de que denominação ou religião for, estivesse apoiando um governo (qualquer governo, de qualquer partido, de qualquer ideologia) e agora rompesse com ele, como se fosse uma agremiação política. Afinal, é igreja preocupada com as negociações por poder terreno ou com o reino de Deus, como está no seu nome? 

Pessoalmente acho a política um assunto muito sério e apaixonante. Os irmãos que me conhecem, ouvem o que prego e leem o que escrevo sabem de minhas posições pessoais. Não as escondo. Porém, faço de tudo para deixa-las fora do templo e sem subir os degraus do púlpito. Isso porque, para mim, púlpito só é sinônimo de palanque no dicionário. 

Isso não quer dizer que a igreja não deve ter posições políticas e se manifestar no que concerne a elas. A igreja precisa ser posicionar pelas causas referentes à justiça, à ética, ao cuidado com a família, ao direito ao alimento, ao trabalho, à segurança e educação, às condições de vida digna do povo, à liberdade de pensamento e expressão, etc. Mas deve se manifestar e se aliar a causas justas, pertinentes e oportunas, não a partidos, a grupos ou a governos. 

Cito um exemplo. Anos atrás, quando a África do Sul ainda vivia sob o regime do apartheid, o governo americano proibiu que as empresas de seu país negociassem com  aquele país a fim de forçar as mudanças. Uma grande petroleira rompeu a determinação. Num certo domingo, em todos os seus cultos, os pastores da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos pediram que seus membros parassem de usar os produtos daquela empresa. A reação e o prejuízo foram tão grandes que fizeram a concha abandonar aquele mar. 

Já há muito tempo que a Constituição do Brasil determina a separação entre igreja e estado. Esta é uma postura sábia de todas as repúblicas modernas. Não cabe ao estado interferir nas questões religiosas. Não cabe ao estado doar terrenos para a construção de templos, financiar reformas, nem estabelecer qual adoutrina correta. Também não cabe à igreja participar de partidos e campanhas eleitorais, apoiar candidatos, indicar ministros ou ocupantes de cargos públicos, etc. O papel da igreja é instruir o povo para que esta faça as melhores escolhas nas eleições, contribuir com ideias e cobranças a todas as administrações ou lideranças, apoiar ou criticar causas, não se envolver compartidos e nem com governos. 

A igreja tem como modelo e objetivo o reino de Deus, e este não se identificam com nenhum partido ou governo terreno.


 Santos, 10 de abril de 2016. 

Crente inconveniente 

Há muito que os evangélicos são associados com atitudes desagradáveis e inoportunas para com outras pessoas, especialmente aquelas que não professam a nossa fé. Anos atrás este sentimento estava relacionado a trabalhos evangelísticos, como pregações e cantorias em alto som nas praças ou o incomodar as pessoas no seu lar. Lembro-me de certa vez que, ao pegar a barquinha para o Guarujá, um pregador pôs-se à frente e a tentar converter os passageiros durante todo o percurso. Não questiono o conteúdo da mensagem, mas o direito de quem estava naquele barquinho de não ouvir a pregação. E, sendo que a única alternativa a isso era jogar-se ao mar, ninguém tomou essa atitude, felizmente. 

Mas existem coisas que só pioram com o tempo. E a inconveniência de certos grupos evangélicos parece ser uma dessas. São conhecidos por sua intolerância – até mesmo violenta – com outros grupos religiosos, sua extrema vaidade em atribuir a si mesmos títulos, sua avidez pelos dízimos do povo e seu interesse pelo poder político. Aliás, os evangélicos são o único grupo religioso que forma uma ala suprapartidária no Congresso. Não vemos notícia de alguma ala católica, espírita ou islâmica. Ala conhecida por seus pensamentos retrógrados e interesses não muito claros e não por qualquer contribuição que deu ao interesse nacional.

Há evangélicos que pretendem impor a sua forma de pensar pela força e pela insistência. Volta e meia aparece na minha caixa-postal e-mails enviados por uma tal associação de defesa heterossexual. O nome diz o que pretendem os membros deste grupo. Até aí, tudo bem. Cada um defende o que acha justo. O problema é que têm ideias retrógradas demais, misturam a defesa ética com a adesão a um ideal político e, principalmente, não se sabe quem fala por eles,visto que não consta o nome de ninguém. Escondem-se atrás do anonimato. Esse movimento é pior que homofóbico, é uma espécie de Ku Klux Klan acerca das questões de gênero (sem os assassinatos). E por mais que eu tenha pedido para me tirarem de sua lista, continuam me enviando seu lixo. 

O importante é notar que, se pedirmos uma mobilização contra a fome, pela adoção de crianças abandonadas, uma passeata exigindo melhorias na educação pública,um movimento cobrando melhores condições nos hospitais e causas assim, poucos evangélicos se proporão a participar. Mas as “Marchas para Jesus”, que nada constroem,estão cheias, movimentos reacionários, como o acima citado, tem muitos defensores, e não faltam pedidos de uma  Praça da Bíblia, como se a palavra de Deus estivesse em um monumento e não no coração das pessoas. 

Nós cristãos, evangélicos ou não, temos como referencial o reino de Deus. Por isso,devemos olhar para o mundo com o amor que o Senhor tem por ele, a ponto de enviar seu Filho para morrer pela humanidade pecadora e pervertida. Se Deus tivesse pelos pecadores o ódio que essas pessoas demonstram, não agiria com o amor que tem agido. Jesus nunca se indispôs contra ninguém tido como pecador,pelo contrário, demonstrou amor por eles. O Mestre só hostilizou as pessoas que agiam como esses evangélicos, e lá como cá, afirmando assim fazerem em nome de Deus. 

É preciso amar como Jesus amou, não discriminando e nem combatendo as pessoas,mesmo as pecadoras. É preciso combater o pecado, o verdadeiro pecado. Tanto oque está no outro como o que está em nós, na forma de ódio. O pecado que discrimina e separa que diz que é natural que alguns tenham privilégios e outros negados os seus direitos. O pecado que Jesus combateu não o que dizem que ele combateria. E, mais do que combater o pecado, construir o amor ajustiça e a paz do reino de Deus.


Santos, 17 de abril de 2016

As aparências enganam 

olhamo-lo,mas nenhuma beleza havia que nos agradasse. Is 53,2

 Em meio à crise em que vivemos, um setor da economia parece não sentir os seus efeitos:é a indústria da beleza. As pessoas (homens e mulheres) não deixam de comprar os produtos de perfumaria e embelezamento que o mercado oferece. E não é só. Um dos ramos mais rentáveis da medicina é o da cirurgia plástica estética. Há muitas razões para isso, desde a vaidade pessoal, passando pelos padrões de beleza e comportamento impostos pela mídia indo até fatores econômicos, visto que pessoas de boa aparência são melhor aceitas nas disputas por colocação no mercado de trabalho. 

Não estou querendo dizer com isso que as pessoas não devem se cuidar ou cuidar de sua aparência, mas em que grau isso ocupa as preocupações de alguém. E, mais ainda, gostaria de refletir a respeito de como julgamos as pessoas pela sua beleza, pela forma como se vestem, pelos acessórios que usam, etc.

Vivemos em uma sociedade na qual as pessoas são pré-julgadas pela roupa que vestem,pela forma como penteiam seu cabelo, ou como se arrumam. Se alguém se aproxima de nós trajando roupas caras, usando joias, com cabelo arrumado e perfumado a nossa tendência é prestar atenção a ela, responder-lhe com gentileza e procurar atender à sua solicitação. Mas se uma pessoa mal vestida ou desarrumada se aproxima, ficamos apreensivos e nossa tendência é a repulsa. Mas muitas vezes nos enganamos e os “engomadinhos” nos fazem mal ou os desarrumados nos trazem coisas boas. As pessoas são julgadas pela estética, mas a estética nem sempre reflete a ética. 

Quando fui iniciar minha pós-graduação, tinha ouvido que a Universidade Metodista havia recebido um professor holandês, muito competente, para lecionar hebraico e Antigo Testamento. Imaginei um senhor de meia-idade ou mais, cabelos grisalhos ou brancos, que vestia terno risca-de-giz. Eu me inscrevi para ter aulas com ele. No primeiro dia de aula cheguei e entrei na classe vazia. Entrou um aluno que eu já conhecia de vista e depois entrou uma figura: um homem alto,jovem, loiro, vestindo camiseta regata, uma bermuda de surfista, calçando sandália de sola de pneu e com uma bolsa de couro a tiracolo. Pensei comigo: tem aluno que vem para a aula vestido de cada jeito! Quando ele se aproximou de mim e disse: “Você deve ser o Marcos! Prazer, eu sou o Jan, o seu professor.” E como eu aprendi nos anos de convivência que tive com o Jan! 

Os tempos atuais estabelecem o império da beleza. Os artistas são julgados pelos seus atributos físicos e não pela qualidade de sua arte. Talvez por isso que semostre tanto mais os físicos esculpidos em academias e clínicas do que a capacidade artística. Profissionais são escolhidos pela roupa que vestem e não pela qualidade de seu currículo. E até pastores há que tem o seu conselheiro de estilo pessoal. 

O Senhor olha antes para o coração, para o interior de uma pessoa, pela integridade de seu caráter, pela sua fidelidade à palavra de Deus, pela disposição em servir ao próximo e praticar o amor, a justiça e a solidariedade. Deus não se deixa levar pelas aparências.


Santos, 24 de abril de 2016 

Nosso presente

 

Meu saudoso cunhado Gilmar era muito inteligente na hora de dar presentes aos amigos e, principalmente, a seus irmãos. Ele dava discos, os discos que ele queria ouvir. Assim ganhavam os recebedores e também ele mesmo que acabava escutando as músicas que gostava. 

Como ele, existem muitas pessoas que ao escolherem um presente, decidem por aquilo que elas mesmas gostariam de receber. Mesmo que não vão desfrutar dele. Outras pessoas já se preocupam em presentear com aquilo que o presenteado desejaria ganhar. 

O rei Davi se enquadrava no primeiro grupo de pessoas, ou, pelo menos, agiu assim uma vez. E justamente quando quis ofertar alguma coisa significativa para o Senhor.Ele decidiu que iria construir um templo, uma casa para Yahweh. Afinal, o que mais o Senhor poderia querer? Um belo e amplo edifício para reunir as pessoas que iriam adorá-lo. Um lugar em que seu santo nome fosse sempre lembrado, em que os sacrifícios e ofertas pacíficas fossem oferecidos a ele, em que se cantassem hinos em seu louvor e para onde as pessoas peregrinassem a fim de trazer as suas preces. Deveria ser tudo o que Deus queria!

Só que não! Não era isso que o Senhor queria. Ele não habita em casa feita por mãos humanas (At 7,48). Embora Davi estivesse até bem intencionado, não era esse presente que Deus queria receber dele. Davi estava mais interessado em dar ao Senhor um presente que agradasse a ele, Davi, mais do que ao próprio Yahweh. 

De que adianta construir um grandioso e belo templo para o louvor a Deus se, no capítulo seguinte a essa narrativa, ele mata o seu servo e vizinho para ficar com sua esposa com quem tinha adulterado? O que era mais grandioso, o edifício ou o pecado? No que o Senhor estaria mais interessado? 

Mas não condenemos a Davi. O rei belemita fez apenas aquilo que muitos de nós fazemos também. Queremos agradecer a Deus ou alcançar uma bênção (o que é pior) e decidimos oferecer algo ao Senhor: nossas ofertas, nosso jejum, uma forma de comportamento, nossa frequência à igreja, ou outras coisas assim. Todas elas são coisas boas e importantes. Mas será que são elas que o Senhor quer receber de nós? Estamos oferecendo isso para satisfazer ao coração do Senhor ou ao nosso? 

Essa pergunta nos remete ao salmista que levanta a mesma questão: Que darei ao Senhor por todos os benefícios que me tem feito? (Sl 116,12). Pois nos versículos seguintes, ele mesmo responde: Tomarei o cálice da salvação, e invocarei o nome do Senhor. Pagarei os meus votos ao Senhor, agora, na presença de todo o seu povo. O que o Senhor quer de nós é o nosso coração, o centro da nossa vida, o lugar de onde procedem todas as nossas intenções e vontades. Ele não está interessado em qualquer outra coisa se esta não for fruto do compromisso do ser humano para com ele. 

 O presente que o Senhor quer de nós é a nossa vida e o nosso compromisso para com ele e para com o próximo. É um coração contrito e arrependido. É a busca para fazer a sua vontade. As pessoas, às vezes, querem lhe ofertar outras coisas, coisas que agradam mais ao seu próprio coração do que ao do Senhor. Ofertemos a Deus aquilo que lhe agrada, não aquilo que satisfaz nossa vontade


Santos, 01 de maio de 2016. 

O trabalho enobrece a pessoa 

Tive uma professora na faculdade de História que dizia que, quando via seu filho adolescente estudando, dizia: “Larga os livros, meu filho, que isso não dá futuro para ninguém! Pega uma bola e vai aprender a jogar futebol ou um violão e aprender a tocar sertanejo universitário!”. Essa estranha orientação,principalmente partindo de uma professora universitária, revela um sentimento de desencanto com a sociedade. Muitas pessoas percebem que o estudo e o trabalho não são adequadamente reconhecidos e financeiramente recompensados.Para muitas pessoas, somente artista ou jogador de futebol tem chance de ganhar dinheiro. 

Nada contra essas profissões, que são dignas como todas as outras. Muito mais grave é quando jovens com pouca formação moral se enveredam pelas sendas do crime ou da prostituição por conta do dinheiro que recebem nessas atividades e que não teriam chance de conquistar em nenhuma atividade honesta e digna. O problema é quando se perde o referencial do trabalho como um serviço prestado à sociedade e o tem apenas como meio de ganhar dinheiro, seja de que modo for.

Nessa relação há, com certeza, uma terrível inversão de valores. O capitalismo nasceu como uma forma de organização econômica que valorizava o trabalho e aquele que empregava as suas forças em produzir algo de útil. Não sem motivo, capitalismo e protestantismo se influenciaram mutuamente em seus respectivos primeiros passos. Célebres protestantes, como Benjamim Franklin, formaram também a base moral do capitalismo sobre o trabalho e a ética. 

O povo brasileiro – talvez como herança da monarquia – vê o trabalho como algo desprezível, degradante, principalmente o trabalho braçal. Trabalhar é coisa de gente que precisa, quem não precisa vai curtir a vida. Quem quer enriquecer,tem como objetivo parar de trabalhar. 

Por isso, certas atividades úteis e até essenciais à sociedade são muito mal vistas e recompensadas em nosso país. Revolta a muitas pessoas que pessoas que cumprem atividades essenciais não tenham nem sequer suas necessidades mais básicas supridas, enquanto outros sem tanta relevância vivem em luxo e ostentação. 

Há,inclusive quem veja na Bíblia uma forma de desprezo pelo trabalho, quando o Senhor, ao expulsar o ser humano do paraíso, o condena a conquistar o pão de cada dia com o suor do seu rosto (Gn 3,19). Ora, o castigo não foi o trabalho em si, mas o torna-lo pesado ao ser humano. Afinal, ao criar o ser humano, o Senhor já lhe designara tarefas (Gn 1,28) específicas no governo da criação e no levantamento do seu próprio sustento e conforto. E, se trabalhar fosse um ato degradante, o próprio Senhor não teria trabalhado na criação e continuaria trabalhando até agora (Jo 5,17). 

Há diversas formas de trabalho (braçal ou intelectual) e diferentes modos de ser útil (produzindo, servindo, cultivando, administrando, etc.), e todas as formas produtivas são dignas. A dignidade do trabalho não está no seu status social ou no ganho que por ele se recebe, mas no serviço que se presta. O trabalho pode ser uma bênção quando entendido como uma dádiva de Deus para que as pessoas se realizem, sintam-se importantes em relação às outras e ao mundo que as cerca,independente da remuneração por ele gerada. O trabalho é uma das formas pela qual elas se integram à sociedade, se tornam úteis, e se podem entender como participantes ativas do grupo no qual estão inseridas


Santos, 08 de maio de 2016.

O lado materno de Deus 

Em nossos manuais de Teologia Dogmática afirmamos que Deus não tem gênero, ou seja, não é masculino nem feminino. No entanto, a grande maioria das representações que dele fazemos o é na forma masculina. Deus é pai, é um senhor de idade avançada e longa barba branca, é sempre tratado pelo pronome masculino“ele”, dentre outras representações. Faltam representações femininas do Senhor. 

As religiões politeístas resolveram esse problema com a inclusão de deusas e setores do cristianismo com o culto à Maria. Até mesmo o judaísmo popular antigo tinha lá suas expressões femininas para a divindade. 

A Bíblia, por sua vez, apresenta imagens de Deus que se aproximam mais do universo feminino do que do masculino. Há textos nas Escrituras Sagradas que só podem ter sido compostos por mulheres e elas refletem neles as suas experiências e nelas veem a presença do Senhor.

É, por exemplo, o que está escrito no Sl 131,2: como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança é a minha alma para comigo. Somente aquela que segurou um filho nos braços e o amamentou é capaz de fazer esta comparação. Somente quem é mãe sabe o que uma criança sente ao se aninharem seu colo. E esta imagem nos fala do que sentem aqueles que estão com o Senhor. 

A criança pequena quando está nos braços de sua mãe se sente totalmente segura.Isso não significa que os perigos tenham deixado de existir, que o universo está em paz. Não. As ameaças continuam a existir e a criança sabe disso. Mas ela sente que não há mal que possa atingi-la quando ela está protegida pela mãe. Assim também, quem está nos braços do Senhor não está livre de aflições, mas sabe que está totalmente protegido por ele. 

Acriança nos braços da mãe se aquieta e fica em paz. Para ela não importa o restante do universo, apenas seu pequeno mundo conta, e seu pequeno mundo está ali. Desfruta do calor e do cheiro do corpo da mãe, tranquiliza-se com sua voz, sente paz no seu amor. De modo semelhante sente paz nos braços do Senhor o cristão que com ele está. 

A criança sabe que sua mãe providenciará tudo de que ela precisa. Se com fome, receberá o alimento; se enferma, terá da mãe o melhor cuidado e atenção; se com frio, o agasalho quentinho; se com medo, a melhor proteção contra o Lobo Mau. Assim também o fiel que busca abrigo nos braços do Senhor. Sabe que Deus, talvez, não lhe dê riquezas em abundância, mas a cada dia o pão não lhe faltará, mesmo que com dificuldade. 

Com essa imagem a salmista demonstra que Deus que é pai, tem muito de mãe e que seu amor por nós não pode ser compreendido a não ser por imagens que temos de pessoas que nos amam quase tanto quanto o próprio Senhor


Santos, 15 de maio de 2016.

O Espírito Santo nos leva a falar outra língua 

O relato do dia de Pentecostes que existe no livro de Atos, quando o Espírito Santo veio sobre os discípulos de Jesus, conta que quando eles estavam em Jerusalém e receberam o Espírito começaram a anunciar o Evangelho e pessoas de outras regiões, que falavam outros idiomas, começaram a entender o que eles diziam como se fossem em seus próprios dialetos. 

O que aconteceu em Pentecostes foi completamente diferente do fenômeno ocorrido na igreja de Corinto, chamado de glossolalia e oriundo do paganismo grego, pelo qual as pessoas em êxtase pronunciam palavras ininteligíveis. Esse fenômeno, glossolalia, se parece muito com o que as igrejas pentecostais e neo pentecostais chamam de dom de línguas. É quando alguém fala algo num linguajar que ninguém mais entende. 

Ao contrário dele, o que aconteceu no Pentecostes foi ação do Espírito Santo e o povo de Deus precisa prestar atenção a ela. E pedir para que se repita em nós oque aconteceu lá. 

No dia de Pentecostes aconteceu um grande movimento de comunicação. Lá, cada um entendia a pregação dos apóstolos como se fosse em seu próprio idioma. É como se hoje brasileiros, franceses e americanos ouvissem um discurso e cada um o entendesse na sua língua. Se, quem conhece a língua estrangeira tem dificuldade de entender o que um local diz, quanto mais alguém que não sabe tanto do outro dialeto. Quando entendiam na sua língua, entendiam muito melhor a pregação dos apóstolos e o Evangelho que eles anunciavam. 

Precisamos aprender a anunciar o evangelho na língua que as pessoas entendam. Muitas vezes falamos, falamos e o mundo não entende nada. Não entende porque queremos tratar de coisas em que eles não estão interessados, ou não faz parte da sua vida. Não significa que devemos mudar o conteúdo do evangelho, ou falar as palavras que sejam agradáveis às pessoas. Não é isso. Mas mostrar que Deus está presente no mundo, no nosso mundo, nas nossas lutas, no nosso cotidiano. 

A comunicação produzida pela palavra que se entende é meio de comunhão. Através dela Jesus se apresenta como salvador das nações, de modo que eles se tornam um só povo, o povo de Deus. Não são mais israelitas ou gregos, romanos ou persas.É o povo de Deus. A presença do Espírito gera uma comunhão que não vem apenas do estar junto, mas do se comunicar, se compreender, se perdoar mutuamente, do amare se solidarizar. O povo formado pela presença do Espírito Santo não é um ajuntamento disforme, mas uma nação com fortes laços de comunhão. 

A ação do Espírito Santo na igreja vai muito mais além do que somente comunicação e comunhão. Essas foram apenas duas dimensões da sua ação que quisemos destacar hoje. Duas importantes dimensões que precisam ser estudadas e, principalmente vividas, pois o Espírito que agiu em Pentecostes continua agindo no meio do seu povo


Santos, 22 de maio de 2016.

Infantilidade espiritual 

Em Ef. 4,14, o autor usa uma expressão negativa que ainda hoje retrata a situação de muitos crentes: para que não mais sejamos mais como meninos, agitados de um lado para outro e levados ao redor por todo vento de doutrina. Essa expressão vem complementar, por oposição, ao que ele já escrevera no versículo anterior, umas linhas antes: até que cheguemos.... à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo (Ef 4,13). Essa figura de linguagem não é única, pois em outros textos do Novo Testamento a vida cristã é comparada à vida cristã, o novo nascimento, o crescimento espiritual, a maturidade na fé. 

Essa comparação nos leva a observar que a vida cristã, à semelhança da vida física,passa por etapas de desenvolvimento segundo o tempo. O problema é que nem sempre o crescimento espiritual acompanha o tempo de vida cristã. Existem pessoas que, mesmo tendo o tempo, não cresceram na medida que delas se esperava. Como uma criança que não cresce adequadamente, podemos dizer que sofrem de raquitismo espiritual. 

Os sintomas desse problema na vida de um crente são diversos. O primeiro deles já nos é apresentado pelo próprio texto: é ser facilmente levado por qualquer novidade que apareça, um novo vento de doutrina. Isso acontece com quem não tem certeza do que pensa ou crê, não tem convicção de sua fé. Hoje segue esta doutrina, amanhã aquela. Qualquer igreja é boa para esse tipo de pessoa, o que interessa não é sua doutrina, forma de comunhão ou sistema de governo, mas o oba-oba que faz. 

Outra demonstração de infantilidade espiritual vem daquelas pessoas para quem nada está bom se não for feito do jeito que elas querem. O sermão não é bom se o pastor não prega o que se quer ouvir, os cânticos são ruins se não forem os que se gosta, e até a cor da parede do templo não é adequada se não for a da sua preferência.Tudo tem que estar conforme a sua vontade. 

Há também as pessoas se ofendem intensamente por qualquer coisinha, qualquer discordância, uma crítica inocente qualquer. São capazes de abandonar a igreja, ofendidas, se alguém diz que não gostou da cor de sua camisa. 

Há ainda outros casos de infantilidade espiritual que, como esses, muitas vezes se confunde com imaturidade pessoal. O fato é que não foi para isso que o Senhor nos salvou, não é para uma vida assim imatura para a qual Cristo morreu por nós. Na vida cristã, como na vida natural há um crescimento que é esperado em todas as dimensões. Quando ele não acontece, isso significa algum problema. 

O crescimento na vida espiritual se dá através do cultivo da íntima comunhão como Senhor e com os irmãos, experimentar a sua presença em todas as ocasiões pelas quais passamos e a compreensão da sua vontade para cada situação. Somente nos espelhando em Jesus é que chegaremos um pouco próximos da estatura de Cristo


Santos, 29 de maio de 2016.

Tempo de guerra e tempo de paz 

A paz é uma das condições mais desejáveis por toda a humanidade. Não sei de ninguém que, ao menos publicamente, deseje a guerra, o conflito, ou a violência. Estas situações só provocam dor, sofrimento e destruição. Por isso, ninguém de bem e em sã consciência deseja outra condição que não seja a paz. 

O fato,porém, é que nem sempre a paz é possível. A Bíblia num texto de raízes sapienciais expressa que há tempo para a paz e tempo para a guerra (Ec 3,8). E o próprio Senhor Jesus encarnou tal aparente contradição ao dizer que deixava a paz para seus discípulos(Jo 14,27), mas que veio trazer o conflito(Mt 10,34).Aparente contradição porque há um duplo sentido na palavra paz. 

Um sentido, usado pelo Mestre quando disse que deixaria a paz aos seus discípulos,se refere a uma paz diferente da que o mundo conhece, procura e promete. Uma serenidade que o mundo não conhece e não pode conhecer, pois é fruto da vitória sobre ele e o pecado que nele há. A paz resultado da esperança e da fé em Deus e no seu reino.,

O outro sentido, que é o do qual tratamos agora, diz respeito à paz que o mundo pode e deve oferecer, mesmo que ainda falha e imperfeita. Nessa situação a presença de Jesus é motivo de conflitos. Ela expõe as rupturas da paz, mostrando que esse equilíbrio é frágil e falso. A presença de Jesus desmascara a aparente, porém falsa, paz. 

Falsa paz porque nem toda aparência de tranquilidade indica segurança e serenidade.As nações que sofrem com governantes autoritários ouvem de seus dirigentes palavras que conclamam à resignação à situação de opressão como se isso significasse paz. Fazem isso até para legitimar seu autoritarismo. Essa situação não é nova. O livro de Jeremias já fala de situação semelhante em seu tempo(Jr 8,6-11). Essa paz que  falam essas pessoas é falsa porque baseada em premissas erradas. Acham que paz é a simples ausência de conflitos evidentes,quando não é. 

Para a Bíblia, a paz é fruto da justiça (Is 32,17). Portanto, se não há justiça, não existe paz, mesmo que aparentemente não haja conflitos. Um povo que vive injustiçado não constrói jamais uma sociedade em paz. Ela pode até maquiar os seus conflitos, escondê-los durante algum tempo, mas um dia eles afloram, tanto mais fortes quanto foi a força para ocultá-los. Somente uma sociedade justa constrói a paz. 

Falamos aqui em sociedade porque, para a Bíblia, a justiça e a paz são condições que só existem concretamente na experiência coletiva, nunca isoladamente em um indivíduo. Não existe, para as Escrituras Sagradas, uma pessoa justa em paz emmeio ao sofrimento do povo. Ao contrário, se alguém busca a paz somente para si, este é o ímpio. E o conflito expõe a impiedade e a tentativa de escondê-la com palavras de paz onde ela não existe. 

Certamente que a Bíblia não nos ensina a promover conflitos e discórdias, mas a buscar o entendimento, a justiça e a digna vida para todos. Mas ela nos mostra que há situações em que o confronto se torna inevitável, não pela vontade de Deus, mas pela injustiça das pessoas. Por isso, antes que eles aflorem, precisamos promover e preservar a justiça e a paz, afinal, Jesus ensinou que os pacificadores são bem-aventurados (Mt 5,9)


Santos, 05 de junho de 2016. 

Uma excelente obra 

Ao tratar dos oficiais da igreja, o autor da primeira carta a Timóteo assim inicia o seu discurso: se alguém aspira ao episcopado, excelente obra almeja (1Ti 3,1). Essa simples frase nos leva a refletir alguns aspectos referentes ao ministério da igreja. 

A primeira informação que este texto nos dá é que esta é uma obra excelente, mais do que boa, mais do que ótima. Hoje, mais do que nunca, vivemos um tempo em que se valoriza o serviço das chamadas organizações não governamentais, as ONGs. Existem diversos tipos de ONGs. Existem as sérias, que prestam serviço inestimável à sociedade, como as APAEs, o GRAACC,  o nosso Betel, e muitas outras. Existem ONGs que, embora composta por pessoas honestas, prestam serviços que podemos considerar sem tanta utilidade. Por exemplo, sei de pessoas que formaram uma ONG para ensinar cães e gatos a fazer xixi no jornal. E existem as ONGs criadas unicamente para difundir a filantropia. 

De todas as organizações humanas, qual delas terá a função de proclamar a palavra de Deus e difundir o seu reino?

É verdade que a palavra de Deus não está circunscrita à igreja e nem servem a Deus somente os que se envolvem nas atividades eclesiásticas. Mas a igreja pode ser um instrumento privilegiado na difusão da vontade divina e seus ministros podem ser preciosos instrumentos nas mãos do Senhor. Pois quem assume o ministério responde ao chamado do Senhor para se juntar a ele não na construção de uma igreja ou na preservação de uma instituição ou empresa. Quem assume o presbiterato ou diaconato se envolve com o trabalho que é de Deus. A excelência desta obra está na sua origem divina e na sua finalidade: o reino. 

O texto bíblico acima citado também menciona que existem pessoas que aspiram a esses ministérios, portanto, não é ilegítimo assim proceder. Porém há formas legítimas e formas ilegítimas de se aspirar ao ministério do Senhor. 

A forma legítima de se aspirar ao ministério é em resposta ao chamado do Senhor e com espírito de serviço a Deus e a seu povo. O Senhor tem muitas formas de expressar o seu chamado, como a Bíblia nos mostra. Cada qual terá de reconhecer nesta ou naquela forma a voz do Pai que o/a convoca para o seu serviço. E esta convocação, quando vier de Deus, será confirmada através do reconhecimento do seu povo. 

Do mesmo modo só será legítimo o ministério daquele que o assumir com o firme propósito de servir. Servir primeiramente a Deus e, como consequência, servir ao seu povo e a todos os que necessitem. Pastores, presbíteros, diáconos ou qualquer um que desempenha qualquer ministério na casa do Senhor não o faz para satisfazer seus desejos ou a sua vontade, mas para servir e fazer a vontade de Deus. 

Já as formas ilegítimas de se aspirar a qualquer ministério são muitas e não podemos desdenhar da criatividade humana para encontrar modos de expressar seus anseios de poder ou de vaidade pessoal. Só pedimos a Deus que guarde o seu povo desses maus dirigentes.   

Ao chegarmos a mais uma eleição para oficiais da igreja, que seja o Senhor quem escolha, confirme e capacite os seus escolhidos para os ministérios ante o seu povo


 Santos, 12 de junho de 2016

Ele ergue do monturo o necessitado (Sl113,7) 

Diz o ditado popular que para baixo, todo santo ajuda, ou seja, sempre nos parece que quando estamos passando por problemas, nos parece que só encontramos mais e mais pessoas dispostas a nos prejudicar enquanto poucos são os que nos apoiam para superar as dificuldades. Parece que problemas chamam mais problemas e todos eles nos afetam, nos derrubam. 

Durante a nossa existência podemos passar por diversos tipos de aflições, oriundos de diversas causas. Passamos, certamente, por transformações em nosso corpo que,mesmo sendo naturais e pelas quais todas as pessoas passam nos trazem insegurança; vez ou outra enfrentamos enfermidades, umas mais graves, outras nem tanto; há muitos que passam por incertezas no campo financeiro ou profissional; outros ainda passam por terríveis problemas familiares, apenas para dar alguns exemplos. Usualmente, inclusive, um ou mais tipos de problemas se entrelaçam, aumentando a pressão e o desespero. 

Quando as aflições vêm, as pessoas podem se sentir fortes para enfrenta-las durante algum tempo, porém, se as dores se alongam, mesmo as mais fortes se debilitam e caem. E, aqueles que nem mesmo são fortes, são derrubados por toda a sorte de infortúnios. O fato é que, quando vêm as turbulências da aflição e da necessidade não há quem tenha forças para se sustentar. 

Mas o Senhor é quem levanta do pó o abatido. Isso não significa que os problemas serão resolvidos ou eliminados como num piscar de olhos. Também não significas e alienar, fingir que não há aflição ou ansiedade. Do mesmo modo não se deve sublimar a dor, como se não deva sofrer pelo simples fato de ser cristão. 

Significa em primeiro lugar encarar os problemas, inclusive o maior que é a morte, como parte natural da vida. Faz parte da existência humana adoecer, sofrer e morrer.Certamente que isso dói, se chora e se quer evitar essas situações. Mas também se sabe que em um momento ou outro se há de passar por elas. 

Significa principalmente conhecer e experimentar a presença fortalecedora e consoladora do Espírito do Senhor. Ele está com os seus filhos ensinando-os a enfrentar as dificuldades e não a fugir delas ou a tentar se esconder delas. O cristão não pode ignorar os problemas, mas é chamado e apoiado por Deus a enfrentar e resolver as questões. 

Essa presença manda ao crente não temer ainda que existam problemas, O Senhor está com os seus filhos a buscar a melhor solução para cada um deles. Ele lhes fortalece na busca por um resultado que seja justo e apropriado.

 

Desse modo, apoiando e ajudando a enfrentar os problemas e a encontrar a solução adequada para eles, o Senhor não ignora que as aflições possam abater os seus filhos, mas os levanta e os coloca em posição de dignidade

Santos, 19 de junho de 2016.

É mentira!

 Rubem Alves contava que, quando a energia elétrica chegou às fazendas do interior de Minas Gerais, onde ele morava quando criança, nas casas dos colonos, como seu pai, colocava-se uma única e muito fraca lâmpada no centro da casa. Como as paredes eram até certa altura, a pouca luz sombreava a casa toda. Incomodadas,as pessoas reclamavam que, na verdade, uma única lâmpada não iluminava cômodo nenhum da casa. Foi quando um deles saiu com uma pérola, dizendo que havia descoberto uma forma de iluminar um cômodo determinado: ele acendia a lâmpada e depois desatarraxava do soquete e levava a dita cuja acessa para o outro cômodo.parece até piada a inocência com que se aceitava tal mentira. 

Uma das características de nosso povo brasileiro é conviver pacificamente com a falta de verdade seja no dia-a-dia das pessoas comuns, seja nas informações oficias,seja nas notícias publicadas nos órgãos de comunicação. As desculpas mais esfarrapadas de nossos líderes são dadas com as caras mais inocentes, as notícias mais estapafúrdias são dadas por veículos  de comunicação que manipulam as informações descaradamente, os boatos mais sem sentido são passados de boca em boca com se fossem verdades históricas e as pessoas usam das inacreditáveis desculpas para remediar seus erros. E todos aceitam como se fosse a mais pura verdade. 

O fato é que a verdade não tem. para nós, o mesmo peso que para outros povos.  Nas nações com um maior nível cultural e social, a palavra de uma pessoa é considerada de alto valor e extremamente valorizada, tanto por quem fala como por quem ouve. Quem fala não mente e quem ouve sabe que se trata da verdade. A quebra desse pacto é considerada um erro gravíssimo, intolerável, pois produzido conscientemente por quem o comete. A palavra de uma pessoa tem elevado valor. 

Por aqui não é assim, a começar pelo fato de que as pessoas não valorizam a sua própria fala. Dizer ou não a verdade é tão relevante quanto a cor da xícara com que se toma café. O importante não é falar ou não a verdade, mas ser pego ou não na mentira. Ou nem mesmo isso, o importante é não ser confrontado por alguém que conhece os fatos. 

As pessoas não percebem que essa postura permissiva com o erro é extremamente anosa para cada indivíduo e para toda a sociedade. As pessoas passam a não mais acreditar umas nas outras e tal desconfiança traz grande prejuízo à sociedade.

 

Para nós, cristãos, a verdade é um bem a ser cultivado e preservado. A Bíblia em diversas passagens exalta a verdade contra a mentira e a falsidade. Jesus chega a afirmar que a verdade é o caminho da liberdade e que a mentira tem o adversário como pai.Dentre os Dez Mandamentos está o de não dar falso testemunho. E o Mestre nos manda a ter uma única palavra. Por isso, falemos sempre a verdade.

Santos, 26 de junho de 2016.

Honestidade com Deus 

Pode parecer estranho que alguém tente ser desonesto justamente com aquele que conhece todos os corações e todas as coisas, aquele que sonda os corações e intenções antes mesmo que eles sejam conhecidos do ser humano. Mas isso acontece com mais frequência do que pensamos e, muitas vezes, justamente com aqueles que desejam ser mais fiéis ao Senhor. 

Ser honesto com Deus significa ter com ele um relacionamento transparente no que se refere aos nossos desejos, anseios, medos, etc., com relação a todos os nossos sentimentos, enfim. É expressar a ele o que sentimos verdadeiramente, sem mascarar o que se passa em nosso coração. Existem pessoas que, a pretexto de uma aparente piedade, tentam demonstrar alegria quando há dor, aceitação quando há revolta, fé quando há incerteza, força quando há fraqueza. 

Tal atitude não traz a verdade e não é isso que Deus quer do ser humano.  Deus não o criou para  sofrer silenciosamente e sozinho. 

Deus não fez o ser humano para resignar-se diante da injustiça, alegrar-se com a dor, ou esconder seu sofrimento. O Senhor criou cada pessoa para ter com ele um relacionamento no qual expressasse com sinceridade e honestidade o que vai ao seu íntimo. Isso não é pecado. 

Nenhum relacionamento é verdadeiro se ele se expressa nas aparências e não na realidade. Assim também é com Deus. Não são piedade nem submissão a resignação e tentativa de negar a dor e o sofrimento. Isso não é espiritualidade, é alienação. 

A Bíblia traz vários exemplos de pessoas que ousaram se posicionar diante do Senhor expressando suas lutas e aflições: Jacó, Jó, a mulher siro-fenícia e outros.Nenhum deles foi condenado ou acusado de insubmisso por Deus. Ao contrário,todos eles tiveram profundas experiências de fé e foram respondidos, talvez não como esperassem, mas todos obtiveram a atenção e a resposta do Senhor. 

Certamente que para expressar a sua dor diante do Pai há o modo correto. Não se pode querer impor a Deus uma resposta, como se ele fosse obrigado a retornar ao ser humano segundo a vontade deste. Não. É preciso saber que ele é Senhor e nós somos seus servos. Mas, à semelhança da mulher siro-fenícia podemos apresentara ele os nossos argumentos e à semelhança de Jacó podemos insistir com ele até que nos responda.

 

Deus quer que coloquemos diante dele em humilde submissão, mas também em sincera ousadia, todo o nosso inconformismo diante daquilo que nos agride e causa aflição. Como e quando elevai responder, não podemos impor a ele. Mas ele nos incentiva a persistir em nossas orações a apresentar nossos argumentos na esperança de que ele nos responderá, podendo até mudar a sua vontade para atender a nossa voz

Santos, 03 de julho de 2016. 

Um relatório preocupante 

Nesta semana o Ministério Público de São Paulo divulgou um preocupante relatório a cerca da criminalidade entre adolescentes e crianças na capital paulista. Nele estava demonstrado algo que já era sentido e comentado empiricamente: segundo dados tabulados, em cada três menores infratores de São Paulo, dois não têm opai em casa. Para ser mais exato, apenas 34% dos menores infratores moram com opai. Os outros 66% vivem em diferentes situações: 23% o pai é separado da mãe,mas mantém contato com os filhos, em 14,5% dos casos o pai já morreu, e existem ainda outras ocorrências.

 Por esse relatório não se pode dizer que todos os filhos de pais ausentes se tornarão criminosos. Nem mesmo que este é o único fator que direciona a vida de alguém para a criminalidade. Mas se pode aferir o quanto a estrutura familiar é importante para o crescimento psicossocial saudável das pessoas. Especialmente a presença paterna, nem sempre tão valorizada quanto a materna. 

Num período de profundas transformações sociais e de intensos questionamentos das instituições vigentes, uma instituição milenar que passa sempre  por diferentes  configurações como a família  tem sido alvo de críticas e grandes mudanças. O problema é que ninguém tem a exata dimensão das consequências dessas mudanças. E talvez nem se preocupe com isso. 

 Veja-se, por exemplo, a questão do divórcio.Certamente que este não é o plano de Deus para o fim de uma união matrimonial.No entanto, há casos em que se torna inevitável e até necessário. Porém, a banalização das separações é tratada com glamour pelas mídias que exaltam os famosos de coisa nenhuma, como se essas pessoas fossem exemplo de vida. E muitas outras pessoas desprovidas de firmes critérios de decisão se deixam levar por esse falso brilhante e mau exemplo. 

Ou como também é vulgarizada a questão sexual, em que os corpos – mesmo os ainda não preparados biológica, psicológica e/ou socialmente – são coisificados, tratados como simples objetos de prazer e comércio. A sexualidade, embora se fale em liberdade, é motivo de imposição de um determinado tipo de comportamento segundo os interesses do mercado. 

Estas e outras situações têm como componente uma grande dose de individualismo, pois que as pessoas tomam suas decisões e agem levando em conta apenas e tão somente seus interesses individuais e imediatos. Não se pensa que as decisões que se toma, mesmo as mais íntimas e pessoais, têm consequências sobre a vida de outrem e que esses outros podem ser inocentes. 

Deve-se também observar outros componentes dessa tragédia, componentes cuja culpa não pertence a uma pessoa especificamente, mas a toda a sociedade: a falta de educação e padrões éticos elevados, a permissividade, a irresponsabilidade coletiva, etc.

 

O fato é que, dentre fatores pessoais e coletivos, a igreja tem uma enorme responsabilidade missionária e social para com o nosso povo, especialmente o nosso povo pobre e mantido na ignorância por interesses mesquinhos. Temos a responsabilidade de levar a luz de Jesus e sermos o sal desta terra, não só com o exemplo, mas também ensinando uma alternativa de vida que gera mais vida e segurança, não abandono e violência.

Santos, 10 de julho de 2016. 

O Rei das nações 

No meu tempo de juventude havia um grupo musical especializado em cantar músicas latino-americanas, especialmente andinas, chamado “Raíces de América”. Dentre as suas muitas e belas canções, havia uma particularmente bonita chamada “Fruto do Suor” que tratava da conquista e colonização de nosso continente. Em certo trecho dela se canta assim: “O ódio à toa levantou paredes, a baioneta desenhou fronteiras, e a estupidez nos separou em bandeiras”. 

De ato, ao olharmos para o mapa da América Latina (como também para o mapa da África ou da Ásia) percebemos que as fronteiras e bandeiras não foram estabelecidas segundo os desejos dos seus povos, mas para atender a interesses outros. Embora mais recente, um episódio que exemplifica esse fato foi o conhecido plano norte-americano de dividir o Brasil em dois países após a II Guerra. 

E mesmo onde  as fronteiras foram estabelecidas pelas  próprias nações,elas atendiam à vontade de parte do povo, e não a todos. Veja-se um caso expresso na Bíblia: ao retornarem da Babilônia a antiga elite monárquica de Jerusalém pretende restaurar as fronteiras com os povos vizinhos, fato que explica em parte as missões de Esdras e Neemias. Já os camponeses que ficaram na terra se relacionavam bem com os moabitas, edomitas e outros povos não vendo motivo param se separarem. Tal sentimento está expresso no livro de Rute,dentre outros textos bíblicos. 

Isso nos leva a refletir sobre a leitura que se faz de alguns textos bíblicos em que parece que Deus tem algum tipo de predileção por um ou outro país, por um ou outro povo. Esta falácia tem levado pessoas a admirar determinados países e até identificar suas ações como se fosse expressão da vontade de Deus. Ou como se misturam os símbolos da pátria, como a bandeira de um país, com os símbolos da fé cristã. Não se pode identificar o Senhor com nenhum país ou povo, nem mesmo com Israel. 

Ao chamar Abrão para dele fazer um povo, o Senhor lhe disse que nele, Abrão seriam benditas todas as famílias da terra. Isso significa que a bênção dada a ele seria também sobre todos os povos. Muitas outras passagens do Antigo Testamento mostram que o divino propósito de salvação era para toda a humanidade, não apenas para Israel. Uma demonstração disso é que no fim do livro de Salmos,lemos: “todo ser que respira louve ao Senhor”. 

O Senhor não criou as pessoas separadas em povos e nem a terra dividida em países. Tudo isso foi feito por intervenção humana. Diante do Senhor não somos brasileiros, judeus, árabes, africanos ou ingleses, somos homens e mulheres que necessitam do Senhor. O amor divino não se detém em fronteiras. Para Deus só há um povo, o povo humano. O povo por quem Cristo morreu. Por isso, não há um Rei das nações. Há um só Senhor que é sobre todos em todo o universo


 Santos, 17 de julho de 2016. 

Bonita camisa, Fernandinho! 

A propaganda brasileira é considerada muito criativa e capaz de produzir peças que permanecem na memória do nosso povo, mesmo na daqueles que não a assistiram. Uma dessas foi a de uma marca de roupas masculinas que encenava um areunião num empresa na qual todos compareciam com a camisa igual à do chefe,menos um, que usava a marca da propaganda. O chefe admirava a roupa do funcionário e a tentava copiar e terminava o comercial com a frase que se tornou o bordão ouvido até hoje. 

Esse comercial revelava outro aspecto, muito comum na nossa cultura pós-moderna, que é a tendência ao conformismo e à padronização. Na citada peça publicitária,esse conformismo se mostrava através da prática do uso de roupas iguais por todos. E esse é uma das dimensões que me parecem mais contraditórias no mundo atual. 

Em nosso mundo afirma-se a necessidade de espaço e expressão para as minorias e grupos  marginalizados.  Afirma-se a prática da tolerância para vida em diversidade. Isso em si é muito bom, mas o que se vê é, na realidade a padronização de uma forma de pensamento e um tipo de comportamento. Quanto mais se prega a tolerância, menos se tolera quem pense diferente. Quanto mais se afirma a diversidade, mais se impõe uma uniformização do pensar e do agir. Parece que temos cartilhas (preparadas por quem?) a respeito de como respondera cada situação. 

Não se pratica a tolerância, não se vive em diversidade. Apenas se alterou o pensamento e a forma de vida dominante. Nem mesmo os grupos que impõem as diretrizes se alteraram, pois continuam os mesmos. E hoje, se alguém pensa diferente, se comporta de outro modo, não usa as roupas da tendência, não consome as marcas do mercado e não assiste aos programas elogiados pela crítica, esse alguém é tão ou mais marginalizado do que seria na época da sociedade “intolerante”. 

Quem deseja seguir a Cristo há de se tornar tolerante. Afinal o Mestre nos ensinou a amar, inclusive, os nossos inimigos e a responder com bondade a qualquer um quenos ofende. Ele mesmo nunca atacou a quem quer que fosse considerado diferente,inferior ou fosse marginalizado. Ao contrário, o Senhor só atacou aqueles que queriam impor padrões. Por isso, o cristão é tolerante de verdade, não apenas de aparência.

 

O cristão, de igual modo,também não pode se conformar com as ideias padronizadas como se elas fossem a verdade a ser seguida sem nenhuma consideração crítica. A cada dia surgem novos problemas e novos posicionamentos. É preciso ser criterioso para não se deixar levar nem por um tradicionalismo que preserva o erro nem pela novidade que introduz a mentira. E a base da qual o cristão extrai os seus critérios só pode ser a Bíblia, e não a voz da mídia. Historicamente, a voz do povo, a filosofia e os meios de comunicação já fizeram as pessoas acreditar em grandes mentiras.A Bíblia, corretamente interpretada, nunca

Santos, 24 de julho de 2016.

O 31 de Julho 

No próximo domingo estaremos comemorando mais um aniversário da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, o seu 113º. O movimento dos pastores brasileiros que culminou com a separação da igreja americana teve motivos bastante significativos na época e consequências que perduram até hoje. 

A primeira e mais marcante característica decorrente daquele ato histórico foi a formação de uma marca de identidade. Até hoje a Igreja Presbiteriana Independente do Brasil é conhecida por ter declarado a incompatibilidade entre a fé cristã e a Maçonaria. Esta situação é mais um daqueles casos em que a condição menor alcançou notoriedade maior. Explicando: dentre as exigências que os pastores brasileiros apresentaram ao Sínodo, a Maçonaria ocupava o terceiro lugar, mas passou para a história como se fosse o primeiro. 

Historicamente,o que fez surgir a IPIB não foi a questão maçônica, mas a independência (daí o seu nome) da igreja americana. O movimento de 1903 foi um grito de liberdade frente a imposições estrangeiras que não atendiam os interesses espirituais e missionários da igreja brasileira. Esse grito repercute até hoje tanto positiva quanto negativamente.

Positivamente podemos afirmar que a Igreja Independente assumiu a sua proposta de estar ligada à cultura e às questões do seu país. Uma igreja sensível à cultura brasileira, sem deixar de ser presbiteriana. Quando de sua formação houve quem duvidasse que ela iria prosperar caminhando apenas com seus próprios recursos.Não só caminhou como cresceu e tem se espalhado tanto pelo Brasil como alcançando campos missionários fora de nossa pátria. Também tem crescido na sua presença no mundo através da participação em órgãos de comunhão reformada e protestante e significativa contribuição em espaços internacionais de diálogo teológico. 

Mas nem tudo são flores. A coragem e a ousadia tiveram seu custo. A abdicação dos recursos estrangeiros restringiu sensivelmente a capacidade de trabalho e alcance de nossa igreja. Basta verificar que outras denominações, que na época eram do mesmo tamanho da nossa, cresceram muito mais nesse tempo, apoiadas em recursos que vieram de fora. O desejo de independência teve o seu preço. 

A história da IPIB também mostra que, nesse tempo todo houve muita descontinuidade, ou seja, houve momentos de grande crescimento e outros de quase completa estagnação. Muitos projetos iniciados foram logo abandonados e substituídos por outros, o que causa insegurança e prejuízo. Mudanças, muitas vezes, que não traziam nenhum ganho. 

Outro problema, a meu ver, é que passados 113 anos, as divisões ainda permanecem. Já era tempo de o diálogo e a comunhão entre presbiterianos brasileiros suplantaras rachaduras da divisão. Embora sejamos todos cristãos, calvinistas e confessemos a mesma fé, as mesmas doutrinas e a mesma forma de governo ainda permanecemos divididos em dezenas de igrejas, muitas vezes dialogando mais com outros grupos do que entre nós. Mesmo separados em instituições diferentes,poderíamos nos aproximar mais.

 

Comemorar e refletir,celebrar sem perder a visão da realidade. O 31 de Julho é momento de gratidão,mas também de pensar em nossa história, tanto a transcorrida quanto a futura.Estudar o passado como também orar e preparar o amanhã. Sabendo que o Deus quenos trouxe até aqui nos conduzirá sempre nos santos seus propósitos

Santos, 31 de julho de 2016. 

SHAMUEL 

“E chamou seu nome Samuel; porque dizia ela, o tenho pedido ao Senhor” 1Sm1,20b 

Shamuel, meu filho: hoje é um dia particularmente importante para nós, seus pais, pois teremos a oportunidade de apresenta-lo ao batismo diante da igreja. Por certo você ainda não é capaz de compreender o significado deste ato, mas esperamos que um dia você venha não somente a entender como também a confirmar essas promessas.

Cremos que você faz parte do povo de Deus, e por isso o trazemos ao sacramento do batismo,sinal desta graça.

Temos consciência que você foi um presente que Deus nos deu. Mas Ele não nos deu você para que você ficasse conosco. Você nos foi dado para que cuidássemos de você e o entregássemos para o Senhor e para que você seguisse os seus próprios caminhos.

Esta tarefa é de muita responsabilidade! E sabemos que sozinhos somos incapazes de cumpri-la. Por isso vimos diante de Deus e da igreja pedir que Ele venha nos dar sabedoria e forças para isso.

Porque assim cremos e sabemos, nós o colocamos diante do altar de Deus, prometendo educa-lo no amor do Senhor e pedindo que Ele nos ajude a isso. 

O texto acima foi extraído do boletim da IPI de Pinhal do dia 25 de agosto de 2002, data do seu batismo. O retomamos quase quinze anos depois porque hoje você, por sua própria decisão, comparece perante o Senhor e perante a igreja para declarar que as promessas que fizemos naquela ocasião se cumprem em sua vida. Hoje se confirma o seu batismo. Você é filho de Deus e pertence ao seu povo. 

Nossos sentimentos, meus e de sua mãe, são de dever cumprido. Não haveria nada de mais rico ou importante que pudéssemos deixar para você do que a fé no Senhor. Temos consciência de que nós, de nós mesmos, não poderíamos colocar isso no seu coração. Isso é obra do Espírito Santo e, por isso, somos gratos ao Senhor.Ele, mais do que ninguém, também cumpriu a sua promessa de suscitar a fé em você. 

Sabemos que você ainda tem muito a se desenvolver física, psicológica e espiritualmente. Nenhum ser humano está perfeito enquanto nesta vida. Nosso ser vive em construção. Nos muitos dias que o Senhor lhe há de conceder você ainda o experimentará de diversas maneiras. Haverá momentos de alegria e segurança no Senhor, mas também de dor, frustração e dúvida. Todas essas situações fazem parte da existência. O importante é você saber que Jesus está com você em todas elas. 

Nós só esperamos que aquele que começou e tem dado continuidade na boa obra em sua vida continue dirigindo o seu caminhar e que você continue sempre depositando a sua fé e esperança no único verdadeiro Senhor e Salvador.

Marcos Paulo Bailão 

Como na ocasião mencionada acima, pedimos desculpas à igreja pelo uso que hoje fazemos deste espaço


Santos, 07 de agosto de 2016. 

Quantos que corriam bem...

 

À vista disso, muitos dos seus discípulos o abandonaram e já não andavam com ele .Jo 6,66

 Num antigo hino do Salmos & Hinos, lia-se em uma de suas estrofes “Quantos que corriam bem/ De ti longe, agora, vão”. Já naquela época, podemos então deduzir, sofria-se de um mal que atinge a igreja até os dias de hoje: o grande número de pessoas que abraçam a fé por um momento e em seguida abandonam a igreja, a comunhão dos irmãos e aparentemente até fogem da presença de Deus. 

Se atentarmos para o texto bíblico acima citado veremos que o problema é ainda mais antigo, vem desde os tempos de Jesus. Como o Evangelho de João os chama de discípulos, ainda que tenham abandonado ao Mestre, não vou entrar aqui na discussão se essas pessoas eram salvas, se permaneceram salvas, etc. Minha intenção aqui é observar como muitos abraçam a palavra do Senhor e depois dela se afastam. 

Haveremos de nos lembrar de muitos assim. Pessoas que em determinado momento apareceram no meio do povo de Deus e demonstraram conversão sincera, assumiram a liderança  de ministérios  e ocuparam cargos na administração eclesiástica, talvez até mesmo de oficiais ordenados. Demonstravam grande fervor e “espiritualidade”, mas tão rápido como ascenderam, declinaram, abandonaram a comunhão e não se percebe a sua presença dentre o povo de Deus. 

O interessante é que quando alguém as encontra e pergunta o motivo de seu afastamento, a culpa é sempre do outro: a igreja que é fria, os cultos que não são animados, o irmão é que o ofendeu, as outras pessoas é que não servem a Deus de forma correta. Nunca é ela mesma que esfriou na fé e se afastou. 

O fato é que existem pessoas que pensam que se converteram, mas não se converteram de fato. Foram atraídas pela emoção de uma pregação, ou um hino, especialmente em um momento de maior fragilidade psicológica. Se emocionaram com aquela palavra naquele momento específico e foram levadas por seus sentimentos, mas não por um quebrantamento de fé. Outras pessoas se converteram com sinceridade em seus corações, mas não desenvolveram a sua salvação, para usar a expressão de Paulona carta aos Filipenses. Param naquela única experiência com Cristo e não mais caminharam. Ao chegarem as tormentas da vida, esqueceram-se de ter em Deus o seu porto seguro e naufragaram com suas impiedosas ondas. Outras ainda foram atraídas pelos falsos brilhantes do mundo e acharam mais interessantes outras formas de vida que não a proposta pelo Senhor. 

Nosso intento não é recriminar as pessoas que se afastaram depois de terem abraçado o evangelho de Jesus. Muito menos julgar se são ou não salvas. Tal veredito pertence a Deus e somente a ele. A cada um de nós cabe apenas orar por essas pessoas e demonstrar amor para que elas voltem ao convívio de fé da igreja.

Queremos apenas alertar os irmãos para que não incorram no mesmo erro. Todas as pessoas estão sujeitas a serem tentadas a abandonar os caminhos do Senhor, esquecer seus ensinos e passar a viver segundo os padrões deste mundo. E é preciso cuidado para não se deixar levar pelas falsas expectativas criadas pelo mundo. Por isso é preciso atenção para não incorrer neste erro. Afinal, servir ao Senhor não é apenas a opção mais correta, é também a melhor opção.


Santos, 14 de agosto de 2016. 

O culto cristão 

O Cristianismo tem como uma de suas principais doutrina a de que o ser humano existe para cultuar a Deus. Diferentemente de outras religiões em que as divindades são concebidas como seres que existem para atender aos interesses humanos e, por isso, podem ser manipuladas por ele, dentre os seguidores de Jesus, Deus é soberano e a humanidade foi por ele criada para o seu louvor. A ordem estabelecida na criação, portanto, é: Deus é louvado e as pessoas o cultuam. 

Ao falarmos de culto é preciso relembrar algo da maior importância, antes de tudo.O culto cristão não se esgota nos momentos em que passamos junto com outros irmãos. O verdadeiro culto é a submissão e serviço ao Senhor no cotidiano pessoal.A adoração cristã é expressão litúrgica da vida das pessoas de modo que a existência de cada um é o verdadeiro culto e as reuniões são consequência e complemento dele. 

Como consequência da vida de submissão e serviço ao Senhor, é preciso ressaltar, oculto é prestado a Deus e a ninguém mais. As reuniões devem ser agradáveis a ele mais do que a qualquer outro. Qualquer culto que se preste com a maior preocupação de agradar pessoa, seja ela pastor ou outro oficial da igreja,visitante ou qualquer autoridade é um falso culto. Deus e somente Deus é digno de louvor e glória, só a ele é prestado o culto. 

O culto é uma festa prestada em homenagem a Deus. Por isso o chamamos de celebração.Como toda festa é momento de encontro e alegria. Como toda festa tem também uma ordem de acontecimentos, com momentos mais importantes e outros menos. Nossa celebração tem dois pontos centrais: a santa ceia e a proclamação da palavra. 

Como extensão da vida, nossas liturgias devem expressar o que somos o que vivemos oque sentimos nossas aflições, nossas esperanças e nossas expectativas. É fato que nossa forma de culto nos aproxima do restante do povo de Deus de outras partes do mundo, mas também preserva o nosso jeito de ser brasileiro. Nossa hinologia é um bom exemplo disso. Cantamos os hinos tradicionais que nos foram trazidos de fora, mas também incorporamos a música brasileira, seu ritmo,melodia e temática. Somos presbiterianos, mas com jeito de ser brasileiro. 

O fato de sermos presbiterianos não pode ser desprezado. Isso significa que trazemos uma longa tradição. Tradição cabe dizer, não significa algo superado e morto,mas uma história viva que nos confere identidade e explica quem somos e como chegamos até aqui. Essa é uma história de fidelidade à palavra de Deus em meio às condições do tempo e da sociedade. Como reflexo nossa ordem litúrgica e nossos cantos têm base bíblica e as Escrituras Sagradas são lidas e o sermão,um dos pontos centrais da ordem, é o comentário de um trecho da Bíblia. 

Celebremos ao Senhor com alegria e singeleza de coração e com submissão e integridade devida


Santos,21 de agosto de 2016.

O esporte e a fé 

Estamos chegando ao fim dos jogos olímpicos do Rio de Janeiro. A realização deste evento foi o cumprimento de um sonho que começou muitos anos atrás, se tornou mais concreto há sete anos quando a Cidade Maravilhosa foi escolhida para hospedar a versão das Olimpíadas que, pela primeira vez viria para a América do Sul. Muitas expectativas, mais ainda preocupações, cercaram a preparação para o evento. E, entre acertos e erros, o fato é que a realizamos. 

Quando escrevo esta pastoral os jogos ainda transcorrem, mas é possível afirmar que em cada um de nós alguma ou algumas cenas ficaram marcadas, seja da alegria de uma vitória, seja da tristeza de uma derrota, seja a de vitórias que não foram expressas em medalhas, como a entrada no Maracanã da delegação de refugiados:pessoas sem pátria, mas cidadãos do mundo. Certamente muitas outras cenas fizeram brilhar os nossos olhos. 

Nesse clima, é possível perguntar o que o esporte tem a ver com a fé. E não estou falando dos atletas que expressam sua crença nas roupas que vestem, nos objetos que portam ou apenas em gestos. Refiro-me às lições que a prática esportiva pode ensinar às pessoas comuns a respeito do cultivo da vida com Deus.  Embora na Bíblia esteja escrito que o exercício físico para pouco é proveitoso (1Tm 4,8), ensino com o qual eu concordo plenamente, aliás, a preparação esportiva tem o que nos ensinara respeito da vida espiritual. 

A primeira lição que a preparação esportiva tem para a vida espiritual é a questão do foco. O atleta de alto rendimento se isola o máximo possível para se dedicar quase que exclusivamente aos treinos e competições. Tudo é feito para que nada prejudique o seu desenvolvimento esportivo. Pois assim também deveríamos considerar a comunhão com Deus. Nós, seres humanos, precisamos focara vida no conhecer, conviver e servir ao Senhor. Jesus expressou essa situação quando disse que quem toma o arado e olha para trás não é apto para o reino de Deus (Lc 9,62). 

Outro ensino é com relação à dedicação. Nenhum campeão iniciou seus treinamentos às vésperas da Olimpíadas, mas anos antes. Em alguns casos, a vitória é resultado de quase uma vida toda de preparação. Para isso é preciso dedicação e perseverança anos seguidos, enfrentado e superando muitas dificuldades. Ser cristão, de modo semelhante, não é resultado de um ato, uma decisão, uma experiência com o Senhor, mas a consequência de toda a vida de dedicação e perseverança no evangelho. 

O esporte é, por sua condição de competição, uma atividade em que se busca sempre a excelência. Esforça-se ao máximo porque uma pequena diferença que seja pode significar a vitória ou a derrota. Na vida espiritual não se vive em competição, não cabe uma disputa entre quem serve mais ou menos a Deus. Mas sempre se busca dedicar o que de melhor se tem, o melhor de si. O primeiro dos mandamentos nos coloca esta condição (Lc 10,27). 

Mas existe um ponto no qual esporte e fé se distanciam totalmente. O campeão, no esporte é só um, aquele que supera todos os seus adversários e se coloca acima deles. No esporte, só um é considerado vencedor. Não é assim com Deus. Com Jesus é exatamente o contrário. A vitória não é de uma pessoa ou de uma equipe.Em Jesus somos todos vencedores, ou melhor, mais do que vencedores


Santos,28 de agosto de 2016. 

As nossas expectativas 

Ao longo da vida criamos uma série de expectativas a respeito de muitas áreas e situações que enfrentamos no nosso caminhar. Quando crianças imaginamos como será nossa vida adulta, brincamos simulando a profissão que queremos abraçar. E qual menino não desejou ser astronauta, jogador de futebol, policial, dentre outras profissões? E qual menina não sonhou em ser bailarina, professora ou enfermeira? Na juventude essas expectativas se tornam mais concretas,acrescentam-se outras a respeito da pessoa com quem haveremos de nos casar, da família que formaremos, e outras coisas. Depois, criamos expectativas para nossos filhos e netos. 

Imaginamo se esperamos muitas coisas a respeito de assuntos importantes como a vida pessoal, familiar e profissional, a respeito da igreja, da cidade e do país,mas também a respeito de coisas menores, como uma viagem que iremos fazer ou o clube de futebol para o qual torcemos. Algumas expectativas são mais intensas,outras menos. E não é raro que criemos uma ansiedade muito grande em torno de assuntos menos relevantes e em outros, mais proeminentes, não esperemos tanto ou tão intensamente.

Em comum, todas essas esperanças têm o fato de que elas se cumprem ou não, total ou parcialmente. A intensidade do desejo que cerca essa ou aquela expectativa corresponde à alegria em caso de cumprimento ou de frustração em caso de fracasso. 

Nós,cristãos, temos na fé o apoio para construir boas expectativas, afinal a fé é a certeza das coisas que se esperam (Hb 11,1). Nossas esperanças não são vazias porque Deus está conosco, ouvindo nossas orações e conhecendo nossos anseios e necessidades. E o Senhor é bondoso e misericordioso e atende às nossas necessidades.Mas nem sempre ele atende no momento em que queremos e nem da forma que desejamos. 

Há situações em que muito ansiamos por algo e essa esperança fracassa totalmente.Nada acontece do jeito que queríamos. Uma vaga de emprego que não se consegue,um querido que não é curado de uma enfermidade, um problema que não é resolvido. Quem nunca viveu uma situação assim? Mesmo nesses casos temos que crer que Deus está no controle e que a solução, embora não seja a que nós queríamos, corresponde ao propósito divino. Se entregamos a ele uma situação,não podemos exigir que essa situação se solucione da maneira que pretendemos,mas sim da forma que ele quer. 

Há outras situações em que o resultado é como pensamos, mas não na hora que ansiávamos. Nesse caso também temos que compreender que o tempo de Deus nem sempre é o nosso tempo, mas que a hora certa é a dele e não a nossa. Ele tem o pleno entendimento das situações e dos tempos, por isso age sempre no momento mais adequado. 

Não podemos deixar de lembrar que, muitas vezes, a resposta de Deus supera de longe as nossas expectativas. Nem sempre somos capazes de guardar na memória tais fatos. Somos muito propensos a esquecê-los e só guardar as frustrações. Porém,se tentarmos enumerar as bênçãos que recebemos, veremos que são incontáveis. 

O importante é crer que Deus sempre vai muito além das nossas expectativas e sempre nos traz o melhor, mesmo quando isso não é o que esperamos


Santos,04 de setembro de 2016. 

Caminhos percorridos, estradas a construir 

Iniciamos hoje as comemorações dos 98 anos de organização de nossa Primeira Igreja Presbiteriana Independente de Santos. Isso é motivo de festa, de gratidão a Deus, de reflexão e de renovação das esperanças. É tempo de, ao mesmo tempo, olhar para trás e para frente. 

Ao olharmos para trás conseguimos perceber quem somos e porque somos assim. São mais de cem anos de história desde que os anglicanos formaram esta congregação,nela construíram uma parte de sua história, a entregaram aos presbiterianos independentes e estes transformaram a congregação em igreja e com ela têm caminhado por tanto tempo. Foram períodos de crescimento e vitórias, intercalados com momentos de tentação, dor, separações, desvios e tantos outros problemas.Ao longo de sua história, esta igreja experimentou situações bem diferentes. 

Cada membro desta comunidade, principalmente os mais antigos, haverá  de se lembrar de  tempos difíceis que  se passaram, como por exemplo, as divisões ou a morte de pessoas queridas. Cada um terá sido marcado mais por esta ou aquela experiência, mas todas elas marcam a história da 1ª. IPI de Santos. 

Vitórias ou derrotas hoje são passadas, explicam como chegamos aqui e o que somos.Também nos servem de referência dos caminhos que haveremos de percorrer, como fazê-lo e como não o fazer. A história nos leva a refletir objetivos e caminhos que percorremos no passado, para onde eles nos levaram e nos fazem reavaliarmos  as opções, permanecendo umas, descartando outras e tomando ainda outras. 

Todos os membros, especialmente a liderança, têm sonhos para a nossa igreja. Sonhamos juntos sonhos conjuntos, ou separadamente sonhos individuais, mas o fato é que construímos esperanças para ela, com ela e por ela. Para tornarmos esses sonhos em realidade é preciso assumir as responsabilidades deles decorrentes,lançar-se ao trabalho e pedir a Deus que confirme a obra de nossas mãos. Não basta apenas sonhar, é preciso trabalhar. Não é suficiente somente trabalhar, é necessário também e principalmente, que o Senhor abençoe nosso trabalho. 

Nossas esperanças são os nossos objetivos. Nosso trabalho é o meio de alcançar esse salvos. Mas há muitas formas de chegar a eles. Essa igreja já experimentou diferentes modelos, viu o que deu certo e o que não deu. Alguns caminhos já estão construídos, outros não. Se percorrermos as mesmas estradas chegaremos,no máximo, nos mesmos destinos. Acho que temos que fazer nossos novos caminhos,achar nosso jeito, viver nossa vida. Temos a Bíblia, temos nossa história etemos nossa criatividade como referências que podemos usar. 

Temos caminhos a construir e percorrer. E nesse processo o Senhor estará ao nosso lado como tem estado já há 98 anos


Santos,11 de setembro de 2016. 

Igreja: povo em comunhão 

A palavra igreja comporta vários significados, entre eles dois que muitas vezes são confundidos como se fosse a mesma coisa: a instituição eclesiástica e o povo de Deus. Não é raro pensarmos em um ao nos referirmos ao outro. No que se refere ao povo de Deus, então, nossa visão não é muito clara já que ele não se apresenta tão evidente diante de nós. Afinal, onde está o povo de Deus? Como o distinguimos? Quem pertence a ele ou não? 

Um dos equívocos que se comete ao tratar da questão igreja enquanto povo é imaginar que ela seja uma espécie de entidade amorfa, sem ordem ou dispersa. Há até quem use a expressão ajuntamento, para se referir à igreja. Expressão essa que não me parece totalmente adequada, pois me traz a impressão de um grande contingente desorganizado. Mas não é assim. A igreja de Cristo se organiza em comunhão. 

A comunhão do povo de Deus se dá porque todas as pessoas que o compõe assim se tornaram pela graça de Cristo. Todos estavam mortos em seu pecado, mas o Senhor os resgatou com seu sacrifício. Portanto nenhum deles tem mérito algum, nenhum deles tem valor maior do que o outro. A comunhão em Cristo se dá pela igualdade que existe entre todos que dela participam. 

A cruz de Jesus confere aos que se curvam a ela a identidade de filhos de Deus,cidadãos do reino, irmãos em Cristo e de cristãos. Tal condição leva-os a outro tipo de comunhão, a comunhão da identidade comum que partilham. 

Se os cristãos partilham de uma identidade comum, é certo também que ela não anula as diferenças entre eles. Ser cristão não anula a personalidade de alguém, sua história, seus desejos e interesses. Cada pessoa é um universo diferente em si mesma. Existem os que confundem unidade com uniformidade, mas isso é um erro. A unidade dos cristãos é na diversidade. A diversidade complementa, não separa.Por isso, a comunhão cristã é na partilha dos diferentes dons, nos distintos modos de pensar, ser e agir. Na diversidade dos membros é que o corpo se torna um. 

A diversidade também provoca atritos. Afinal, são diferentes opiniões,perspectivas e expectativas a respeito do mundo e da igreja. E, às vezes essas diferenças se tornam mais intensas, os atritos mais graves e é preciso, então perdoar. Não há relacionamento próximo cuja história não tenha algumas páginas escritas com a pena da ofensa e da mágoa, Mas também não há comunhão verdadeiras em o uso do mata-borrão do perdão. 

O povo de Deus é constituído em comunhão. Uma fraternidade que não tem base em si,porém, que cabe a cada cristão dar o seu apoio e o seu esforço para a sua edificação. Uma coletividade que não separa ou excluí, contudo chama a todos e todas para dela participar. Uma comunhão que não anula as individualidades,entretanto busca solucionar com justiça os atritos causados por elas. A igreja de Cristo é constituída em comunhão viva


Santos,18 de setembro de 2016.

Um lugar de esperança 

Parece que a cada dia a vida está mais difícil e mais contraditória. Quanto mais se trabalha, menos se desfruta do resultado do trabalho. A cada cura de doença encontrada, descobrem-se mais e mais moléstias. Por mais que as pessoas sejam informadas, mais descuidadamente elas vivem. Quanto mais se desenvolvem as comunicações através de internet, celulares e outros dispositivos, mais solitárias as pessoas estão. Quanto mais aumenta a expectativa de vida, menos esperança as pessoas têm. 

E como é ruim viver sem esperança! É como dar murros em ponta de faca, pois por mais que lutemos, a única coisa que conseguimos é machucar nossas próprias mãos. E mesmo as conquistas que porventura vierem são vitórias efêmeras, circunscritas a um pequeno alcance. A esperança dá fundamento à vida e sentido para as lutas cotidianas, sejam elas mais ou menos intensas mais ou menos relevantes.  

Um fator complicador nesse processo é que existem poucos espaços em que se promove a esperança nas pessoas. E os espaços que que existem promovem falsas esperanças.Até mesmo algumas igrejas, atualmente, preocupam-se em promover expectativas egoístas, de sucesso meramente individual, perdendo a dimensão da comunhão do reino de Deus. 

A igreja de Jesus Cristo é um reduto de esperança diferente das expectativas que o mundo oferece. A esperança do reino de Deus não é um desejo de enriquecimento ou de qualquer outro tipo de sucesso para alguns indivíduos separadamente, mas é a expectativa da construção da justiça e paz que atinjam a todos, inclusive os não creem. 

É certo que a salvação é individual, mas somos salvos para pertencer a um povo, um povo que caminha em direção a um reino de justiça e paz, e no seu caminhar participada construção desse reino. No caminhar desse povo ele constrói a esperança de transformação dos desertos em fontes de vida. 

A igreja é esse povo a caminho do reino, por isso a esperança está no seu próprio ser.Não se trata apenas da esperança de vida eterna, vida a pós a morte, mas a de transformação deste mundo segundo os estatutos do reino de Deus: justiça, paz,amor e solidariedade. 

Esse povo que em comunhão faz crescer a esperança porque consegue enxergar além da realidade existente outra possível, sem injustiça e solidária. Esse povo que se anima e se incentiva mutuamente a permanecer no caminho da fé e a construir junto o seu sonho, a sua utopia. Esperança que não é o acúmulo de riquezas ou poder, nem a transferência da felicidade para uma vida a pós a morte, mas ofato do reino de Deus.  Esse povo é a igreja de Jesus Cristo


Santos, 25 de setembro de 2016.

Um lugar de refúgio 

Um momento tocante na cerimônia de abertura das Olimpíadas do Rio de Janeiro foi a entrada, um pouco antes da delegação brasileira, de uns poucos atletas, que desfilaram com a bandeira do movimento olímpico porque não podiam desfilar com as cores de sua pátria: eram os refugiados. Refugiados são pessoas que, por desastres naturais, perseguições políticas, guerras ou extrema miséria são obrigadas a abandonar seu lugar de origem e buscar socorro em outro lugar,geralmente contando com a generosidade de quem os recebe. O Brasil recebeu nos últimos anos refugiados do Haiti e da Síria que, por motivos diferentes,fugiram para cá em busca de uma vida um pouco melhor. 

Essa condição não é nova. Há na língua hebraica do tempo do Antigo Testamento uma palavra, gur, cujo significado é aquele que habita como estrangeiro. E na Bíblia, em Nm 35,9-15, há a instituição de seis cidades de refúgio. Eram ugares, geograficamente espalhados por Israel e Judá para onde deveriam fugir pessoas que tivessem matado alguém e buscassem se defender. Por isso, enquanto estivessem lá não poderiam ser vingadas. Essa instituição visava dar direito a quem quer que fosse, mesmo a um homicida, o direito de defesa. 

Lugar de refúgio é sempre um lugar que evoca segurança e esperança. Segurança porque o refugiado encontra ali uma guarida onde possa se proteger daqueles que o perseguem. E esperança porque ali há oportunidade de construir os sonhos impossíveis de serem realizados no lugar de onde se fugiu. 

Há casos em que o refugiado é tão bem acolhido e se lhe oferecem tantas oportunidades que ele faz do refúgio sua casa e, mesmo tendo ocasião, não volta mais para seu lar de origem. 

Assim é a verdadeira igreja de Jesus Cristo: um refúgio para todas as pessoas, para pecadores sem esperança, para aqueles que deixaram tudo para trás e não têm mais para onde ir, não têm mais pátria, não tem mais lar, para os cansados e sobrecarregados. Mas o Senhor da igreja os acolhe com amor e lhes oferece segurança, esperança e oportunidade de uma nova vida. Desse modo se tornam cidadãos do reino deste Senhor e não desejam mais voltar para o lugar de onde vieram. Não são somente refugiados, apátridas, mas cidadãos do reino de Deus. 

Todos osque fazem parte da igreja de Jesus são, de certo modo refugiados, e por issodevem também acolher outros que nela buscam abrigo. 

Isso não significa que os que são acolhidos por Jesus e se tornam cidadãos do reino de Deus vão abandonar a pátria a que pertencem neste mundo. Não significa que abandonarão este mundo à sua própria sorte, sem se preocupar com as dores e misérias que ainda existem por aqui. Não vão abandonar esta pátria, mas passam a trabalhar para que ela se pareça cada dia mais com aquela da qual foram feitos cidadãos: uma pátria onde há justiça e paz, vida e esperança


Santos, 02 de outubro de 2016. 

Juízes sem juízo 

No dia 31 de agosto passado, enquanto o país inteiro estava com os olhos voltados para a votação do Impeachment no Senado, o Supremo Tribunal Federal julgou uma ação impetrada em 2011 dando, na prática, direito às emissoras de televisão de exibir qualquer tipo de programa à qualquer hora. Elas devem apenas apresentara título de informação a classificação dos programas. Dizem eles que restringir os horários de exibição é uma forma de censura. 

É no mínimo estranho que haja tal preocupação com a censura quando em 5 de agosto p.p. foi noticiado na internet a investigação que o MPF sobre as igrejas evangélicas na TV. Todos sabem de minha repulsa a esses programas, mas a pergunta que não quer calar é: programa religioso não pode, mas se a emissora quiser veicular violência, pornografia, exploração humana ou outro conteúdo dessa natureza, pode? 

Alguém há de defender a medida dizendo que ninguém em sã consciência irá apresentar programas dessa natureza em horário impróprio. Acho que não devemos confiar tanto no bom senso de nossos empresários, ávidos por lucros não importando como os consigam. E a história da TV brasileira é cheia exemplos. Décadas atrás, o comunicador Serginho Groisman apresentava um programa para adolescentes à tarde, primeiro na TV Cultura e depois no SBT. Era um programa de diálogo com jovens sobre seus assuntos, de forma aberta e responsável. Pois a TV Globo o contratou a peso de ouro e o jogou no limbo da madrugada de sábado para tirar a concorrência de sua novela Malhação, divertida forma de emburrecer nossos jovens e divulgar um tipo de comportamento (inclusive sexual) irresponsável e perigoso.

Essa mesma emissora nunca teve pudor de explorar a sexualidade desde a pequena infância com uma que se dizia “Rainha dos Baixinhos” que difundia um comportamento inapropriado para a idade das crianças a quem se destinava seu programa. E, quando seu corpo envelhecido não servia mais de apelo sexual, foi descarta como um lenço usado. 

Pois eis que a pornografia e a exposição da violência são exatamente isso. Apelativos que tratam seres humanos como se fossem coisas descartáveis, objetos úteis apenas para distrair a atenção das pessoas de assuntos realmente importantes. 

Dizer que quem se exceder será punido é uma mentira deslavada. A última emissora tirada do ar por mostrar algo que não devia foi a TV Gazeta, por mostrar um dos comícios das Diretas-Já, E temos vários casos de propagandas que depois deterem sido veiculadas por muito tempo foram julgadas inadequadas e continuaram a ser exibidas. 

O argumento de que cabe aos pais a tarefa vigiar o que seus filhos assistem na TV não passa de uma falácia, pois na sociedade brasileira são poucas as famílias em que um dos genitores pode se dar ao luxo de estar o tempo todo com os filhos. Ao contrário, deveriam os doutos juízes lembrar que as emissoras de TV no Brasil não são empresas criadas para atender interesses privados, mas são concessões do estado e têm como tarefa contribuir na educação da população. Não só eles. Nossos nobres deputados evangélicos deveriam também se preocupar comisso, mesmo os que pertencem ao partido que iniciou essa ação. 

Desde o último dia 19, uma emissora que pertence a uma igreja que se diz evangélica passou a reprisar às 16h uma novela antes exibida às 22h, com cenas de sexo e violência. Isso demonstra que não só alguns juízes, mas também bispos não têm juízo! 

Se houvesse um pouco mais de juízo, ouviríamos as palavras escritas no livro de Isaías: Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem, mal. Is 5,20


Santos, 09 de outubro de 2016. 

Presbiterianismo e educação 

Quando Gutemberg inventou a imprensa de tipos móveis, uma das mais importantes criações humanas de todos os tempos, o primeiro livro que foi produzido em larga escala foi a Bíblia, traduzida para o alemão por Matinho Lutero. Esta não foi a única contribuição do protestantismo ao longo da história para a educação.O protestantismo tem, ao longo do tempo, uma importante participação no desenvolvimento da educação em todo o mundo.

 A bem da verdade deve-se dizer que não só o protestantismo, mas o catolicismo também teve a sua contribuição. Durante muito tempo, inclusive em muitas regiões do Brasil, os sacerdotes romanos eram os únicos a saberem ler e escrever e as universidades mais antigas, constituídas na Idade Média, como Bologna e Paris,se formaram a partir do estudo teológico. 

O protestantismo, e em particular o ramo presbiteriano, tem, no entanto, uma preocupação particular com a educação. O fato de uma de suas principais diretivas serem a de colocar a Bíblia na mão do povo para que ele a interprete e viva segundo seus ensinos, fez do ramo protestante do cristianismo um incentivador do estudo e da educação de todas as pessoas. É de se lembrar que no batismo presbiteriano, dentre as promessas que os pais fazem a respeito dos filhos está a de lhes providenciar a educação escolar o quanto for possível.  

A Reforma Protestante do século XVI aconteceu em meio a mudanças na forma de pensar e viver das pessoas. O mundo tentava deixar para trás a ignorância e o misticismo e procurava enxergar a realidade de uma forma mais humana e racional. Ela acontece em meio ao movimento chamado de Renascimento e precede outro movimento chamado de Iluminismo. Todos buscando uma vida mais racional. 

Por isso, todas as linhas cristãs decorrentes da Reforma buscam uma fé bem alicerçada na razão. E destas, o presbiterianismo é certamente uma das – se não a mais – racional. A liturgia do nosso culto é quase que totalmente desprovida de símbolos e baseada quase que somente na transmissão racional da fé, através da leitura e exposição, seja pela pregação ou pela música, do que entendemos ser a palavra de Deus. 

Não é dese estranhar, então, a preocupação presbiteriana com o ensino e educação.Algumas das escolas – universidades até – mais prestigiadas do mundo tiveram sua origem em círculos calvinistas. E até hoje o ramo presbiteriano (ou reformado) é profundamente preocupado não só com a educação cristã, a transmissão da fé através do ensino como também com a instrução e pesquisa em todas as áreas da ciência. Para o presbiteriano não existe conflito entre ciência e fé. 

Mesmo no Brasil, um país predominantemente católico, o presbiterianismo tem deixado a sua contribuição no campo da educação secular. Pois o Senhor não que de nós apenas uma vida de fé, mas um ser humano que explora toda a sua capacidade,tanto espiritual quanto intelectual


Santos, 16 de outubro de 2016. 

O Mestre dos mestres 

Jesus recebeu em sua vida muitos títulos e apelidos, alcunhas que revelavam algo sobre sua pessoa ou sobre o que se pensava a respeito dele. O mais comum e conhecido é tão ligado a ele que, não raras vezes, já se confundiu com o seu próprio nome: cristo. A palavra cristo vem do grego e significa ungido,assim como a palavra derivada do hebraico, messias. Esses dois títulos são aplicados a Jesus para explicitar a nossa fé de que ele é o escolhido por Deus para trazer a salvação ao mundo.

Ele também já foi chamado por outros nomes que lhe atribuem funções ou características: profeta, Jesus de Nazaré, e outros. Geralmente até se trata Jesus como tendo um ministério de profeta, sacerdote e rei. Mas um título, em particular, parece ser especialmente atribuído a Jesus: Mestre. Os evangelhos registram mais de sessenta ocorrências em que ele foi chamado assim, embora devamos considerar que algumas histórias de Jesus se repetem em mais de um evangelho. E o próprio Senhor usou desse título em  uma comparação  (Mt 10,24-25).  Além disso, ele chamou seus seguidores de discípulos, o que nos coloca em uma relação de ensino-aprendizado com Jesus. 

Essa relação de ensino-aprendizado foi importantíssima no seu ministério, talvez só superada pelo seu sacrifício na cruz, ato de amor imensurável e cumprimento de sua principal missão, salvar a humanidade. Mas seu ensino não perde. 

A pregação e o ensino de Jesus herdam muito da tradição judaica da sabedoria.Primeiramente na forma em que ele ensinava o povo, através de parábolas e comparações tiradas da vida concreta daquelas pessoas, do uso de frases e provérbios. Jesus falava de uma maneira que o povo estava acostumado a ouvir. 

O conteúdo do ensino de Jesus também está ligado à antiga sabedoria hebraica.Jesus não faz especulações nem abstrações, mas ensina a respeito das coisas do cotidiano das pessoas como amar ao próximo de forma real, como se precaver de pessoas mal-intencionadas, de como deveriam confiar em Deus na lida diária do trabalho, da casa, do relacionamento com familiares e pessoas vizinhas. Na observação das aves e dos lírios se percebe o cuidado de Deus, na observação das estações do ano se reconhece a ação do Senhor, etc. Não transmitiu ideias,mas lições concretas do cotidiano. Ele ensinava de modo que o povo podia entender porque extraía da realidade objetiva daquelas pessoas as leis e os ensinos que eles precisavam aprender. 

Jesus veio primeiramente para morrer por nossos pecados. Ele é o nosso Salvador.Enquanto esteve aqui também curou doentes e alimentou a multidão. Mas Jesus, em todo o seu ministério nunca deixou de ensinar as pessoas a respeito daquilo que era mais importante para elas: a vida e a existência delas e o reino de Deus.Por isso ele é o Mestre por excelência, o Mestre dos mestres


Santos, 23 de outubro de 2016. 

Maravilhosa graça 

No próximo dia 31 de outubro comemoraremos mais um Dia da Reforma. Será o 499º aniversário do movimento que mudou a igreja e a sociedade ocidental no século XVI.Certamente este dia não será lembrado na televisão e nos meios de comunicação,mas isso não diminui a sua importância para os cristãos no mundo todo, sejam eles protestantes ou não. Afinal, estamos caminhando para as celebrações dos 500 anos da Reforma. 

Dentre as principais ênfases no ensino que a Reforma sustentou, a afirmação a respeito do papel da graça da salvação e vida do ser humano é de suma importância. 

A graça,todos repetem, é um favor imerecido. Assim, somos salvos não pelos méritos que qualquer um possa ter, pois esses não ineficazes para a salvação, mas pelo amor de Deus que não poupou nem seu próprio Filho a fim de redimir o ser humano. Só que a graça vai, além disso. E não poucos confundem o que significa graça. 

Antes de tratarmos do que é a graça, é preciso entender o que a graça não é. Algumas pessoas cometem o erro de pensar que, sendo salvos pela graça e não pelas obras, o cristão está livre para se entregar a qualquer manifestação do pecado,pois de antemão já está perdoado de todo erro. Esta é uma visão distorcida da graça e nem tão nova. Na Epístola aos Romanos, Paulo já escreve combatendo este tipo de pensamento. Ele afirma que, apesar de onde abundou o pecado superabundou a graça, ela não é justificativa para nos entregarmos conscientemente ao erro e à iniquidade. 

A graça é o instrumento de Deus para a redenção do ser humano. Mas ela não é apenas o meio de salvação. Ela é também uma proposta de vida para a qual Jesus nos convida. É viver não conforme o que é a cultura do mundo, mas conforme a nova criação de Deus. É desde já habitar o novo céu e a nova terra. 

A expressão concreta desse novo viver está no Sermão da Montanha. É o amar o inimigo em lugar de odiá-lo, participar da alegria do irmão que cresce em lugar de cobiçar suas conquistas. É fazer mais do que nos é requerido, é dar a outra face a quem nos agride, é perdoar em lugar de guardar rancor. É ceder, antes de exigir. É ofertar, mais do que cobrar. É ter o reino de Deus como o bem mais precioso. É considerar que felizes são os pobres, os mansos, os injustiçados,os pacificadores. É viver na dependência do Senhor, confiando que a cada dia assuas misericórdias se renovam sobre nós. Uma vida assim parece ser impossível ao ser humano normal, mas se torna possível pela graça de Jesus. 

Jesus não nos veio salvar para continuarmos vivendo dominados pelo medo, pela violência, pelo egoísmo e pelo pecado. Ele veio nos trazer uma vida em segurança, liberdade, amor e solidariedade que só a sua maravilhosa graça pode conceder


Santos, 30 de outubro de 2016. 

A atualidade da Reforma 

Quando se estuda a Reforma Protestante no séc. XVI muitos pensam que ela se tratou apenas de um movimento religioso que dividiu a igreja cristã, até então unificada sob o pontificado de Roma. Essa é uma ideia totalmente distorcida da realidade. Em primeiro lugar, devemos lembrar que o cristianismo nessa época já era dividido havia séculos entre oriente e ocidente, sendo que o oriente tinha seu centro em Constantinopla. 

Mais comum e igualmente enganoso é o pensamento que entende a Reforma como um acontecimento puramente religioso. Se assim fosse, pouco interessaria aos livros de História. A Reforma foi uma resposta religiosa a um mundo que estava em total transformação. Descobertas científicas como as de Galileu e Copérnico,o descobrimento do Novo Mundo, e novidades tecnológicas como a imprensa de tipos móveis mostram como o conhecimento estava mudando naquele tempo. Mas não era só isso. O sistema feudal que predominava na Europa estava em plena decadência e o capitalismo  iniciava seus  passos em direção  à hegemonia e com ele se reestruturava todo o sistema político, formando as nações europeias. E, mais importante de tudo, na visão de mundo das pessoas, o ser humano passava de mero coadjuvante a protagonista da história. Caminhava-se para a era da razão. 

Num mundo imerso em transformações tão profundas era natural que a igreja e o sistema de crenças que justificavam o mundo como era antes conhecido fossem também abalados e questionados, abandonados e reconstruídos. 

O final do século XX e início do XXI experimentam transformações tão profundas que só poderão ser avaliadas adequadamente daqui a alguns séculos. As descobertas científicas e invenções tecnológicas surpreendem a cada dia. Alteraram-se totalmente os papéis sociais antes estabelecidos, transformando a configuração da sociedade. O ser humano chegou à Lua e na Terra o capitalismo não mais atende às necessidades das pessoas. 

Neste mundo de transformações, a fé que organizava o mundo de então também é questionada. Diante deste desafio, a resposta da igreja só pode ser a de estar sempre se reformando, buscando responder às novas perguntas que surgem a cada dia. 

Para responder a essas perguntas, três princípios fundamentais da Reforma são essenciais: a graça, a fé e a palavra de Deus. Somente na graça de Deus e por meio da fé encontraremos nas Escrituras Sagradas as respostas para as indagações que surgem a cada dia, para as incertezas de um mundo em transformação, para as necessidades do ser humano. 

Aprendemos com os reformadores que não se pode sacralizar uma forma de vida ou de pensar.As transformações do mundo trazem novos desafios ao ser humano e sua forma dese relacionar com o Senhor. Mas somente com a graça, a fé e a palavra de Deus ncontramos as devidas soluções. Novas situações, novas respostas, obtidas através de meios já conhecidos


Santos, 06 de novembro de 2016. 

Estar alegre e ser feliz 

Nesta semana recebi no whatsApp do grupo dos casais um belo texto atribuído ao conhecido psiquiatra Roberto Shinyashiki em que ele afirma que a sociedade moderna impõe às pessoas uma série de condições injustas, ou loucuras como diz,dentre elas a de que se tem que ser feliz todos os dias. Com isso ele se refere a certa ideologia, presente inclusive em discursos religiosos, de que não se pode sofrer os efeitos da dor ou da insatisfação e que toda forma de descontentamento é sinal também de fraqueza. 

De fato,o mundo prega uma visão de mundo em que qualquer tipo de dor ou sofrimento deva ser extinto para que a pessoa. Realização é viver continuamente em estado dealegria. Só que isso é irreal. Ninguém consegue estar alegre em todo o tempo. 

Aí reside uma grande diferença que me leva a discordar em parte do que o sábio psiquiatra expôs. Felicidade e alegria não é a mesma coisa. Felicidade é um estado de espírito de quem sabe que sua vida tem sentido, tem um propósito que está em processo de cumprimento, de quem sabe que é querido e respeitado, que se sente importante para alguém. Já a alegria é a condição momentânea de receber uma boa notícia, de desfrutar de um momento de satisfação. Pode ser um prazer simples, como comer um Sonho de Valsa ou beber uma Coca-Cola (zero) ou uma grande satisfação como receber uma promoção no trabalho ou alcançar aquela conquista pela qual muito se lutou.

Assim,em minha modesta opinião, o que diferencia felicidade de alegria é que aquela é uma situação permanente, enquanto esta é uma condição momentânea. Além disso, a felicidade não depende das circunstâncias imediatas, enquanto a alegria depende. Ninguém, em sã consciência, está alegre quando perde um parente próximo ou um amigo querido. Mas nem mesmo uma situação como essa tira a felicidade de quem o é. 

Entendo também que há no mundo uma ideia de que a felicidade depende da alegria e que esta se constrói através de coisas efêmeras e/ou materiais. Como cristão penso que o ser humano só é feliz quando se relaciona em harmonia com seu Criador,com seu próximo e com o restante da criação. Esta harmonia, quebrada pelo pecado, é restaurada na graça de Jesus Cristo. Somente nesta comunhão restaurada com Deus, com o outro ser humano e com o universo alguém é capaz de experimentar o sentido de sua existência e, com isso, perceber que a felicidade não está nas pequenas e imediatas coisas desta vida, mas num propósito maior,que o une ao Senhor e a toda a criação. 

Tal condição permite descobrir a alegria de experimentar coisas simples e não valorizadas, mas que enchem o coração de satisfação, como um abraço carinhoso,um momento qualquer com as pessoas amadas, o contemplar da beleza do céu num entardecer. Enfim, creio como cristão que a felicidade é um estado de espírito permanente daquele que se reconhece amado por Deus, integrado em seus propósitos e seguro em seus braços e que permite desfrutar os momentos dealegria


Santos, 13 de novembro de 2016. 

Velhos problemas e falsas soluções 

Brasil atravessa uma séria crise econômica, este é um fato que ninguém discute. O que se discute é o tamanho da crise e as soluções propostas para ela. E é interessante perceber como certas propostas aparecem nesses tempos difíceis como se fosse solução e não um agravador dos problemas, e como propostas que já foram rejeitadas aparecem de novo, oportunistas, como se pudessem solucionar alguma coisa. 

Refiro-me ao anúncio do governo federal de pretender legalizar cassinos no Brasil como forma de incentivar o turismo e captar dinheiro externo. Essa proposta é, na verdade, uma imensa mentira disfarçada de verdade. Em primeiro lugar porque cassinos no Brasil não atrairiam jogadores do exterior, visto que – com todo respeito – ninguém deixaria de ir jogar em Las Vegas para visitar Águas de Lindóia, a não ser para comer pamonha, é claro. Se os cassinos fossem um negócio tão bom assim não teriam sido fechados no passado. 

Em segundo lugar, o Brasil não precisa de cassinos para explorar melhor a indústria do turismo. Recentemente tivemos em nosso país dois eventos que trouxeram milhares de pessoas sem depender da jogatina: a Copa do Mundo e as Olimpíadas. E a avaliação do nosso país feita junto aos turistas estrangeiros foi extremamente positiva. 

Alguém dirá que não se tem todo ano eventos como esse o que é verdade. Tão verdade quanto o fato de que nós temos recursos naturais que, por si mesmos, são atração melhor do que a jogatina: praias, fauna, flora, paisagens, etc. Nosso povo é simpático e acolhedor e nossa história e cultura são ricos patrimônios.Uma foto do pantanal é mais atraente do que a figura de uma roleta. Não precisamos de cassinos. 

Além disso, os defensores dessa ideia escondem os “efeitos colaterais” das casas de jogo. Tive um colega na faculdade de história que trabalhava como segurança em um bingo. Ele contava que nesse local, mais do que o jogo, funcionava a prostituição, drogas e outros crimes. Aliás, nenhuma das cidades famosas pelo jogo é conhecida por ser um lugar onde se cultivem os mais elevados padrões morais. E, devemos nos lembrar, um dos motivos para Cuba se enveredar pela revolução socialista foi o fato de estar cansada de ser usada por americanos para jogo e turismo sexual.  Não precisamos trazer esse mal ao nosso país (ou incrementá-lo exponencialmente, se preferirem) para atrairmos recursos. Não precisamos vender nossa dignidade como povo para ganharmos uns tostões. 

Nosso desejo é que nossos nobres deputados evangélicos façam alguma coisa honrada em nosso parlamento e barrem essa medida nociva ao povo e ao nosso país. Que se pense mais na dignidade e menos no lucro fácil


Santos, 20 de novembro de 2016. 

A igreja e o negro 

No dia 20 de novembro comemora-se no Brasil o Dia da Consciência Negra, algo natural para uma nação que tenha recebido tão grande contribuição desses povos na sua formação. Contribuição essa que, quase sempre, é desprezada ou olhada com desdém e preconceito. 

Preconceito que se nega ou se tenta esconder. Dizem que no Brasil não há preconceito ou que ele é social e não racial. Os brancos dizem isso e até alguns negros acabam acreditando. Mas são esses que sofrem o desprezo, a segregação e a humilhação apenas por terem na pele uma cor diferente. 

A alegação de que o preconceito é mais social de que racial encontra razão no fato de que, embora a população afrodescendente seja a maioria no país (o Brasil é o maior contingente de negros fora da África), poucos são os que alcançaram a classe média e quase nenhum representante temos na elite econômica. Isso se deve a fatores históricos como o Brasil ter sido o último país do mundo a parar o tráfico e a libertar os escravos. Em outros países,quando libertos, os escravos foram indenizados por muitos anos de exploração,no Brasil isso não só não foi feito como se cogitou indenizar os senhores pela perda de sua mão-de-obra. 

Para quem acha que preconceito é coisa do passado é só olhar para as recentes eleições dos Estados Unidos para perceber que isso não é verdade. E, num mundo com o potencial de globalizar tantas experiências positivas, o que mais parece se difundir é o ódio e o desrespeito. 

Nossas igrejas não fogem à regra. Apesar da já citada maioria na sociedade, perceba-se a proporção de afrodescendentes dentre nossos membros. E a estatística fica ainda muito menor se atentarmos para a liderança. Há até pessoas que se dizem cristãs (como o Dep. Marco Feliciano) que relacionam a maldição de Cam, filho de Noé, à cor da pele. 

Essa visão, além de totalmente distorcida, é incompatível com o restante da Bíblia,que simpaticamente apresenta uma série de personagens negros, embora nunca os especifique assim. Uma das mais famosas é a rainha de Sabá (1Re 10,1-13) visitante de Salomão.Outro, também conhecido, é o etíope evangelizado por Filipe (At8,26-39). Mas há outros. Podemos relacionar entre eles uma esposa de Moisés(Nm 12,1), o profeta Sofonias (Sf 1,1) e até mesmo a amada do poema de Cantares (Ct 1,5-6). Não há dentre esses nenhum sobre o qual a Bíblia tenha uma visão negativa. 

Para Deus não há diferença de raça ou etnia. Para o Senhor há somente uma raça, a raça humana. Todas são pessoas que ele tanto ama que enviou seu Filho Jesus Cristo para morrer, por todas elas. É preciso a igreja deixar para trás os preconceitos do mundo e viver mais o amor de Deus


Santos, 27 de novembro de 2016. 

Entre o já e o ainda não 

Na história bíblica a vida humana é compreendida como uma jornada em direção a algum lugar de descanso, segurança e aconchego. Inicialmente as Escrituras Sagradas nos contam que ele foi criado e colocado em tal lugar, porém, dele saiu por sua própria culpa, por sua desobediência. A partir de então, o ser humano passou a uma situação constante de forasteiro e peregrino em busca de um lugar para si. 

Quando o Senhor chamou a Abrão para dele formar um povo, o chamou também para sair de sua terra e ir para um lugar indeterminado, ao qual ele só conheceria quando lá chegasse. Ao povo de Israel, então em servil condição no Egito, Yahweh enviou Moisés a fim de conduzi-lo para uma terra que mana leite e mel. Grande parte do Antigo Testamento, quase todo o Pentateuco, se passa na peregrinação desse povoem direção à terra prometida. O período em que o povo habitou a Palestina foide grande decadência espiritual, por isso foi novamente exilado. Lá na Babilônia lhe foi prometido um novo êxodo e a volta para casa. 

O Novo Testamento testemunha a mesma esperança: o povo cristão é chamado de forasteiro e peregrino neste mundo e caminha em direção ao reino de Deus. Esse reino não é distante, inalcançável, mas está no meio do povo desde já, como fermento na massa, crescendo e tomando forma. Até o dia em que será definitivamente instaurado e sua vida consumada. 

A igreja de Jesus vive como o antigo Israel, entre a promessa e o cumprimento, na caminhada por seu lugar de descanso, segurança, e paz. Muitas vezes esse lugar é interpretado com uma situação que se dará ao fim da história, outras vezes é pensada como algo para depois da morte. Sem negar ou abdicar de qualquer uma dessas visões, temos que pensar que a igreja existe nesse mundo para conduzir a sociedade ao reino de Deus, transformar as condições atuais em algo próximo da justiça e paz do reino. 

Nessa condição, o povo de Deus tem um alvo, um objetivo a ser alcançado, embora atingir essa meta não se dê pelo seu trabalho e esforço. A igreja vive em um diálogo entre o presente e o futuro, entre o agora-já e o ainda não, entre viver nesse mundo e o antecipar o reino de Deus, ou ainda melhor, viver nesse mundo antecipando desde já o reino de Deus, 

Mas esse viver não é estático, ao contrário, é caminhar em direção à esperança que nos está proposta. É não se conformar com esse mundo, mas transformá-lo através de uma consciência limpa e proativa, da interferência positiva no mundo das pessoas, testemunhando uma existência diferente e melhor para os seres humanos,a vida com Jesus Cristo, seu reino, justiça e paz. 

Viver com Cristo é o caminhar neste mundo com os olhos voltados para o reino de Deus.É um caminhar de esperança, vivendo desde já a justiça, solidariedade e paz. É esperar e já viver o conteúdo da esperança. É viver com Cristo e aguardar a manifestação total de seu reino


Santos, 04 de dezembro de 2016.

O direito de nascer 

Nesta semana a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu que a interrupção da gravidez até o terceiro mês de gestação não pode ser considerada crime. Desde já, a se lamentar é que tal decisão, como outras tomadas também no Congresso Nacional, se deu num momento em que o país estava com sua atenção desviada para outra situação, no caso o desastre com o avião que vitimou um time de futebol e chocou o nosso povo. Parece que fazem de propósito para que as pessoas não percebam o que se está aprovando e não reajam à decisão. 

A questão da interrupção voluntária da gravidez, o aborto não espontâneo, é polêmica e envolve toda a sociedade, não só a esfera judicial. Ela envolve os campos científico, filosófico, religioso, de saúde pública e familiar, entre outras esferas da sociedade. Envolve a vida de pessoas. Por isso essa questão é tão importante e delicada. Por isso não basta uma decisão para se resolver o problema, por mais nobre que seja a corte. É preciso que toda a sociedade converse sobre ela. 

Deve-se lembrar que não há consenso nem na ciência, nem na religião, a respeito de quando começa uma vida, de quando as células fecundadas podem ser chamadas de um ser humano. Em nosso país esta situação se agrava devido aos grandes problemas econômicos e sociais que enfrentamos. 

Muitos casais e mulheres sem acesso à informação ou aos meios oficiais de prevenção e planejamento da gravidez acabam recorrendo a instrumentos clandestinos de aborto e, sem a assistência médica adequada, as mulheres acabam se machucando,sendo mutiladas ou esterilizadas ou ainda mesmo morrendo. Antes de se condenar qualquer atitude de qualquer pessoa nesse campo, a sociedade brasileira deveria se preocupar mais em educar seus jovens, fornecer-lhes os meios para uma vida saudável e planejada, além de amparar melhor as futuras mães e seus filhos.   

Deve-se dizer que, mesmo nos casos previstos por lei, o acesso a esse serviço na rede pública é tão difícil e tão burocratizado que não poucas mulheres acabam recorrendo aos meios ilegais e inseguros quando teriam direito à assistência médica adequada. 

Outro fator complicador é que, em sua grande maioria, as leis, as normas sociais e religiosas são feitas por homens, quando não são eles que sofrem uma gravidez indesejada. É muito comum que os homens, pais de filhos não planejados, até abandonem covardemente as companheiras grávidas deixando que elas sofram sozinhas todos os problemas e dores desse processo. Por isso, cabe à mulher e a ninguém mais a decisão de levar adiante uma gravidez ou não. Esta não é uma decisão fácil para nenhuma mãe, por isso não se pode imputar a ela um peso ainda maior. 

Logicamente que não somos a favor da morte, mas sim da vida. Deus é o Senhor da vida, ele a dá e ele a tira conforme seus desígnios. Portanto, não podemos aceitar o aborto como alternativa a qualquer gravidez indesejada ou como simples política de controle da natalidade. Pessoalmente penso, até prova em contrário, que a partir da fecundação já existe uma vida humana. Mas a ética não pode ser intransigente e nem estar desvinculada da realidade. Há casos – conforme a própria lei prevê – em que não se pode impor a mãe nenhuma que gere por nove meses determinada criança em seu ventre. Por exemplo, quando a gravidez é fruto de violência sexual ou quando não há chance de vida da criança fora do útero. São casos em que somente a mãe pode decidir


Santos, 11 de dezembro de 2016.

O livro da vida 

Há uma imagem segundo a qual Deus tem um livro no qual escreve o nome de todas as pessoas que são salvas, o chamado Livro da Vida. Essa imagem me parece muito mais metafórica do que qualquer outra coisa, visto que os livros são uma invenção humana que entrou na história depois de um longo período em que as pessoas grafavam a sua comunicação de muitas formas, desde desenhos em paredes das cavernas, passando pelas estrelas, tabletes de barro, papiros, pergaminhos,etc. E hoje os livros estão sendo deixados para trás pelos DVDs, tablets ekindles. Além do mais, me parece sem propósito que Deus precise de um livro para se lembrar quem é dele e quem não é. 

Mas o fato é que existe, sim, um livro da vida. Esse livro não está com o Senhor, mas foi escrito sob inspiração do Espírito de Deus e dado aos seres humanos para que eles encontrassem a vida. Ele se chama Bíblia, é o livro mais lido e impresso de todos os tempos. É a Escritura que influencia gerações há séculos e culturas em todo o mundo. 

Tal influência se dá em primeiro lugar porque ela é palavra de Deus. Isso não significa que o Senhor a ditou para pessoas arrebatadas em êxtase, mas que ele usa esse texto como instrumento para que as pessoas o reconheçam em seus caminhos e em sua história. 

Ela influencia a humanidade também porque seu ensino é capaz de transformar cada pessoa. Segundo ela mesmo se descreve, as Escrituras Sagradas são úteis para a exortação, a correção e a educação que o ser humano seja habilitado para a vida de serviço do reino de Deus. Ela transforma a pessoa e transforma a sociedade. 

Mas não transforma a sociedade somente influenciando a vida das pessoas. A Bíblia tem influenciado diretamente a cultura e o relacionamento social dos povos. Se ela foi perversamente usada para justificar atitudes erradas, e até mesmo crimes,ela também serviu de base para lutas por justiça social, combate ao racismo e à escravidão, promoção da vida. Ela foi uma das inspirações para a Declaração Universal dos Direitos Humanos. 

Hoje a Bíblia está disponível na maioria das línguas faladas em todo o mundo e há um grande esforço para que ela seja traduzida para os idiomas nos quais ela ainda não aparece. Empenho semelhante é feito para a sua distribuição e exposição. No Brasil temos o privilégio de possuirmos um dos principais polos de produção e distribuição do livro sagrado não só em português como em muitas outras línguas. Todo esse vigor será inútil, entretanto, se a Bíblia não for lida, estudada e praticada com cuidado e dedicação. A Bíblia é um livro escrito para ser lido e vivido. Somente assim ela continuará a transformar a vida das pessoas e dos povos, somente pela leitura, estudo e exposição das Escrituras as essoas se reconhecerão nela e serão alcançadas pelo seu ensino. Somente assim ela continuará a ser o livro da vida


Santos, 18 de dezembro de 2016 

Uma jovem grávida de esperança 

Israel no primeiro século vivia um tempo de grandes dificuldades, de desespero, de falta de perspectivas. Politicamente estava dominado por um dos mais poderosos dos impérios já existentes, se não o mais poderoso; economicamente estava situada na periferia do mundo, explorada por seus dominadores e sem qualquer perspectiva de superar a pobreza e a miséria abundantes; religiosamente, se ainda mantinha sua autonomia, esta era dominada por uma casta de religiosos que distorcia os ensinos que seus ancestrais haviam recebido do Senhor e os aplicava em proveito próprio. Nas palavras de Isaías, o povo andava em trevas. 

Havia a promessa de um enviado de Deus que tiraria o povo daquela situação e o resgataria para o seu Pai. Mas há tanto tempo eles esperavam o cumprimento dessa promessa e os sinais da sua vinda a cada geração pareciam se cumprir sem que ele viesse de fato, que o povo já convivia com a frustração e a dúvida se aquilo que fora anunciado anteriormente iria realmente acontecer um dia e quando seria esse dia. 

Em meio a esse contexto de sofrimento e angústia, na região mais pobre do império, numa pequena e insignificante vila, uma desconhecida jovem recebeu a  visita especial: um anjo veio  ao seu encontro e lhe trouxe uma notícia:ela, que não tivera nenhum relacionamento com um homem, mas por obra do Espírito Santo, se tornaria mãe de ninguém menos que o Messias esperado. A ele daria o nome de Jesus e ele seria a presença real de Deus entre os seres humanos. Quanta coisa para uma pobre e simples jovem de Nazaré, pequena cidade nas montanhas da Galileia! 

Aquela situação poderia trazer ansiedade e medo à Maria. O que iriam pensar dela os que a conheciam? Como se comportaria o homem para a qual estava prometida? Oquê ela tinha de especial para que Deus a procurasse para que seu Filho viesse ao mundo? Quantas dúvidas, quantas incertezas! 

Mas Maria não estava grávida apenas de uma criança, um menino como tantos outros na pobre e desesperada Palestina. Ela trazia em seu ventre o Filho de Deus, o Cristo prometido e já não tão esperado. O Messias que haveria de remir a Israel. A sua gravidez não era apenas de uma criança, mas era a fecundação da esperança e da salvação, não só daquele povo que andava em trevas como de toda a humanidade. 

As trevas de ontem parecem escurecer também os céus de hoje. O povo anda sem perspectivas, duvidando de que o que Deus um dia anunciou venha a se cumprir. Trocam, inclusive, as promessas por desejos e satisfações imediatos, corriqueiros e mais próximos. Esquecem do reino e olham para seu próprio estômago. 

Naquele tempo, o nascimento do Rei dos reis passou quase despercebido para a maioria das pessoas. Poucos ligaram, poucos perceberam, poucos testemunharam. E ainda quem o fez não pertencia aos grupos mais importantes e influentes. Eram pessoas simples e até mesmo sem crédito na sociedade. Para a maioria das pessoas continuava a vida normal e sem esperança. 

Hoje o natal de Jesus é comemorado por muitas pessoas, mas nem todas se dão conta do seu significado. Para muitos é só uma festa, uma oportunidade para estar com migos e familiares. Mas para Maria, como para nós, o natal é o nascimento da esperança, é o parto da salvação. É Deus conosco, presente em meio à tribulação e à angústia. O povo que andava em trevas viu grande luz


Santos, 25 de dezembro de 2016. 

A magia do Natal 

Um dos comerciais de Natal deste ano sugere uma pequena menina feliz, justificando a separação dos seus pais, mas que pela “magia de Natal” eles se tornam os melhores amigos. Tal situação só poderia acontecer mesmo na fantasia dos que usam esta data para tentar alavancar as vendas de seus produtos, em primeiro lugar porque nenhuma criança pequena aceita com alegria a separação dos pais e também porque, nunca os casais separados, mesmo os que convivem civilizadamente, se tornam os melhores amigos. Mas tal impossibilidade é superada, no comercial, pela “magia do Natal”, como bem frisa a menininha. 

Mas o que seria a tal magia de Natal? Para o mundo comercial, propagar que nesta época do ano as pessoas se tornam mais solícitas e solidárias é muito positivo, torna-as mais suscetíveis a contribuírem com entidades de filantropia ou de filantropia,a comprarem mais presentes e assim gastarem mais nas lojas e shoppings, a enriquecerem os herodes, fariseus e publicanos de hoje. Enquanto isso, as crianças pobres ainda continuam sem ter lugar nas estalagens..

A tal magia do Natal é um sentimento etéreo, tão falso quanto passageiro. Isso porque este é o Natal do Papai Noel, não o Natal de Jesus. Não se fala do Natal como nascimento do Salvador, do Filho de Deus. Quer-se fazer um Natal que seja para todos, até para os que não são cristãos e, para isso, exclui-se do Natal a sua figura principal, quem é o seu motivo, aquele cujo nascimento é a razão de todas as celebrações: Jesus, filho de Maria, nascido numa estrebaria em Belém de Judá. 

Ao excluir Jesus do Natal, nega-se a sua essência. O Natal passa a ser qualquer coisa, menos Natal. Deixa de ser o nascimento do Salvador, a presença do Deus-conosco, a encarnação do Filho de Deus, o irromper da glória do Senhor entre as pessoas. E é justamente porque na cidade de Davi nasceu o Salvador que se pode ter paz na terra entre as pessoas a quem Deus quer bem. Sem o Salvador não há paz! Sem Jesus não há solidariedade! Sem Cristo não há salvação! 

Mas,pensando bem, talvez o tal comercial não esteja de todo errado. Porque o Natal sem Cristo, a tal “magia de Natal”, pode, no máximo fazer com que uma pequena criança se conforme com a separação dos pais. O verdadeiro Natal faz o que nenhuma mágica é capaz. A presença de Cristo entre nós transforma a realidade, promove a verdadeira paz e solidariedade, o perdão, a reconciliação e a comunhão. Restabelece as relações e constrói relacionamentos – inclusive matrimoniais – mais sólidos, porque fundamentados não nas fracas relações humanas, mas na graça de Jesus. Não faz de casais separados amigos, mas fortalece o amor e o relacionamento entre eles. 

A mágica vende, mas é frágil e passa logo. Leva apenas a paliativos para se conformar com a vida destruída. O Senhor Jesus transforma, ajuda a superar as dificuldades e cria a vida em plenitude.